Mário de Carvalho criou Eduarda Galvão para, à semelhança de todas as suas personagens, nos elucidar sobre a usurpação do mundo real por um de pechisbeque. Ora, se ele nos avisou, já não temos que estranhar que alguém, muito genuíno e autêntico, produza seja o que for fora dessa autenticidade. Pode não passar de uma patranha, mas é, com certeza, uma patranha autêntica.
A jornalista, que há dias, usou nada mais, nada menos, do que cerca de 11.100 carateres, a diabolizar a aplicação da nova lei da escola inclusiva sem, manifestamente, saber nada sobre o que escrevia, não era a Eduarda Galvão, mas deve de ser parente. Com ares de elevada autoridade moral, sempre muito utilizada nestas coisas inclusivas, e alguns laivos técnicos, descreve o perfil de um aluno para, a seguir, enunciar todas as “maldades” a que a escola, supostamente por via das recentes alterações legislativas, o iria submeter. Os que lerem na diagonal indignam-se, logo por altura do título, com tanta maldade legal, os que lerem com cuidado indignam-se, no fim, com tanta artimanha. No meu caso, pelo saber que tenho do assunto, saltei logo para a segunda e, embora acabando por ficar mais descansada com os 470 carateres da nota de fim de página, entre os quais os de “por estar tudo tão confuso fui induzida em erro”, não pude evitar a perplexidade e indignação. Então, o longo texto nascera, inegavelmente, do erro percetivo de alguém (que, no fim, até assume que se enganou) e publica-se na mesma? Bem na mesma, na mesma, não terá sido, porque parece que ainda lhe mudaram o título.
Vá lá uma pessoa pensar que coisas destas só acontecem nos romances! Agora, tenho de andar para aqui a rever conceitos e convicções. A esmiuçar-lhes a génese, esparramá-las nos vidros da janela para as analisar em contraluz. Numa trabalheira para conferir cada uma delas! Porque, havendo muitas que devem ter vindo logo gravadas nos genes, outras tantas lá de casa e da escola, sei bem que as restantes vieram sei lá de onde! Quer dizer, saber, sei. Dos amigos, livros, jornais. Mas, como já se vê, nem todos são de confiar. Contudo, nem é bem esta incerteza a tirar-me o sono. Acho que o que mo tira é a desfaçatez com que as Eduardas Galvão do mundo real querendo confundir-nos, transviam qualquer coisa. Sim, porque não considero que toda aquela incoerência textual seja só por inabilidade. Aquilo só quer, de propósito e a frio, confundir. Não há ali qualquer honestidade. Não houve confirmação dos factos, não houve análise do decreto, não houve visita à escola. No imediato e no caso concreto, não altera nada. O aluno fará o percurso escolar mais adequado ao seu perfil e a escola, ou a Segurança Social, disponibilizará terapias. Se tudo isso é, mesmo, o que o aluno precisa, é que já não garanto, mas acredito que, apesar dos inerentes constrangimentos materiais e humanos, terá o essencial: respeito pela sua individualidade e direito a ser incluído. Mas lá que induz em erro os mais “apressados”, induz!