Moritz Schlick e o Círculo de Viena

Escrito por António Costa

«Caracterizado como “a reunião das quintas-feiras”, neste evento realizado num seminário participavam uma série de professores universitários para discutir questões de ciência e filosofia»

Pouco conhecido fora da esfera académica, Moritz Schlick teve um papel fundamental no surgimento da filosofia da ciência contemporânea com a fundação do Círculo de Viena. Schlick, que obteve um doutoramento em Física com uma tese sobre a reflexão da luz numa superfície não homogénea, contribuiu decididamente para a divulgação da teoria da relatividade de Einstein com obras como “O Significado Filosófico do Princípio da Relatividade” (1915), “Espaço e Tempo na Física Contemporânea” ou “Introdução à Compreensão da Teoria da Relatividade Geral” (1917). Neste segundo trabalho contou inclusivamente com a colaboração direta do próprio Einstein, a quem se dirigiu por carta a 15 de outubro de 1919 para se congratular pela confirmação experimental da teoria da relatividade geral ao prever a curvatura de um raio luminoso que atravessa um campo gravitacional.

O Círculo de Viena surgiu em 1921 e manteve-se em funcionamento até 1936, com a morte de Schlick. Caracterizado como “a reunião das quintas-feiras”, neste evento realizado num seminário participavam uma série de professores universitários para discutir questões de ciência e filosofia. A partir de 1922, o grupo focou as reuniões na leitura pormenorizada da influente obra do filósofo austríaco Ludwing Wittgenstein, “Tractatus logico-philosophicus”. Em 1929 publicaram o seu escrito programático ou manifesto, “A Conceção Científica do Mundo” (“Die wissenschaftliche Weltauffassung”), que contém as ideias centrais da sua visão. Estas afirmam que a explicação adequada da realidade assenta numa matriz científica que se funda no empirismo, isto é, todo o conhecimento procede da experiência e nela se fundamenta, de maneira que é possível estabelecer um critério empirista de significado segundo o qual todo o conceito tem de poder remeter, direta ou indiretamente, para a experiência. Os conceitos que não passam este critério são considerados vazios. Deste tipo são a maioria dos conceitos da filosofia, que para o Círculo de Viena deve consistir numa análise lógica e rigorosa da linguagem utilizada em ciência para eliminar precisamente conceitos vazios, sem sentido ou ociosos. Esta análise lógica serve, portanto, para demarcar o que é ciência do que não é.

A filosofia torna-se assim filosofia da ciência segundo o conceito positivista ou empirista lógico do Círculo, isto é, cumprindo a sua exigência de se ater ao dado, ao positivo, à experiência (empeiría, em grego). A ciência deve, finalmente, servir-se desta linguagem logicamente purificada, e se possível formalizada, de modo a unificar-se segundo o modelo da física, transformada na ciência-padrão graças aos seus progressos recentes, em referência, em especial, à teoria da relatividade.

Sobre o autor

António Costa

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