A minha querida amiga Ana Matos estava revoltada. Não era uma revolta qualquer, era indignação pura. Não espuma porque é fina e delicada, não grita porque não lho permitiram em pequena, mas refila, riposta, acusa, indigna-se parecendo uma militante engajada na revolta. Nada de confusões, a Ana não é de esquerda. Vai à missa, cumpre com os deveres fiscais e trabalha muito para ter seus devaneios, seus exageros, suas apostas, suas verdades. Ela gosta de viajar e viaja. Gosta de levar a família toda e leva. Família grande, que a Tina acreditava na continuidade. Entretanto veio o fim da austeridade, a saída limpa e chegou o Costa e o Centeno. A maior carga fiscal de que há memória abateu-se sobre a Ana Matos e todos os outros que tentam faturar mais dinheiro que 50 mil euros por ano. 15% para os primeiros 15 mil euros, 21% até 30 mil e depois “upa, upa” até bué. Falamos de IRC. Com este Governo acrescentou-se retirar mais 25% acima de 1.750 euros ganhos para Segurança Social e se quiser usufruir dos recibos verdes. Se optar por empresa paga 28% para retiradas de capital. Não há como fugir, as minas estão em todos os caminhos, pois tudo se regista. A morte saiu às contas da Ana Matos que quase os matava se pudesse. Imaginei-a de colete amarelo carregada de ira. De três mil euros não fica nem com mil e duzentos limpos. Para o Centeno fogem por frestas, ruturas e valetas 1.800 euros do trabalho constante da amiga. Só que a Ana abriu os olhos e fez-se luz: a católica percebeu que ainda vai mais no IVA das necessidades e dos desejos, depois como tem uma prestação pública paga no IRS sem fugas, vai na gasolina com que se desloca para os trabalhos, vai nas portagens, vai na empregada, porque uma mãe trabalhadora precisa de ajuda nas delicadezas imprescindíveis da lida doméstica. Ana labuta para estar bem, mas não está. Ana Mata-os de raiva, Ana desespera do esforço infrutífero e eu que, em desesperança, balbucio: não trabalhes! Reduz despesa! Isto não tem solução!
Olha os ricos de França que chegam para não pagar impostos dez anos. Olha os trabalhadores de Portugal que emigraram para França e agora, desde 2018, passam a contribuir para a nossa Segurança Social. Não sei se está mal este facto, sei que os ricos de lá deviam pagar também. Sei que coerência é fundamental em sistemas de saúde para haver justiça na carga fiscal e na distribuição de benesses.