Guarda capital europeia da cultura

Escrito por Albino Bárbara

“Se assim não for, haja coragem de assumir todas as responsabilidades e consequências, humildemente peçam as necessárias desculpas, quiçá, se tiverem uma pinga de vergonha, embrulhem-se nesta folha de jornal, levem umas brasinhas da lareira que alimentaram e vão fazer definitivamente o inferno para outro lado…”

Quando o projeto da candidatura da Guarda a Capital Europeia da Cultura foi apresentada, fui um dos muitos que acreditou que esta era mais uma janela de oportunidade de entrar uma lufada de ar fresco, colocando-nos ainda mais no mapa nacional, europeu e até mundial.
Percebendo isso e, tendo em conta que a candidatura reunia todos os pressupostos considerados necessários e indispensáveis, como são a valorização do património cultural, as manifestações culturais, correntes artísticas, cooperação, criação e mobilização, sabendo acolher os cidadãos da União Europeia, promovendo o diálogo cultural, explorando o património histórico, arquitetónico e outros, bem como a qualidade de vida, percebendo-se que a Guarda consegue satisfazer todos estes requisitos, superando e podendo surpreender todas as outras candidaturas pois temos equipamentos, espaços públicos, salas de espetáculos, história de oito séculos, motivação cultural, associativismo, acolhimento (se necessário até de proximidade), cultura popular diversificada, rotas turísticas, religiosas, gastronómicas, a simbiose que mistura a serra, a raia, o Douro, o Zêzere, a Cova da Beira, numa aceitação e compreensão de todos que de boa-fé acreditaram neste projeto.
Pela parte que me diz respeito (se calhar com alguma ingenuidade à mistura) tentei que o projeto tivesse pés para andar.
O meu testemunho:
O Centro Cultural da Guarda, instituição de utilidade pública, a que tenho a honra de presidir, foi a primeira associação a aprovar uma resolução colocando-se de imediato ao dispor do poder político para tudo o que fosse necessário. Em abril de 2018 apresentei na Assembleia Municipal de Celorico da Beira, bem como na Assembleia Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela, um voto de apoio à iniciativa. A Assembleia Municipal de Celorico da Beira foi a primeira a marcar posição. Mantive a mesma postura nas várias deslocações das valências do Centro Cultural fazendo questão de falar na nossa candidatura. De norte ao sul sem esquecer “nuestros hermanos” de Castilha e Leão.
Os factos, a realidade:
Em janeiro de 2020 foi apresentado, no pequeno auditório do TMG, o executivo da candidatura presidido por Pedro Gadanho depois de terem despedido o anterior diretor (politiquices?). Tive aí a primeira impressão que alguma coisa poderia correr mal. Guardei para mim o pensamento, mas achei que o projeto, com aquela gente, nunca teria pés para andar, pois tal como eu, todos os presentes foram testemunhas de um autêntico exercício de retórica, recheado de algumas figuras de estilo, que genericamente poderiam ser utilizadas em qualquer outra candidatura, chegando ao cúmulo de se defender, como o maior dos maiores de todos os projetos, a construção de uma ciclovia entre os concelhos aderentes desconhecendo a morfologia das serranias beirãs, pois quanto ao resto, quanto aos costumes, nada foi dito. Confesso que vim de lá extremamente desiludido e nesta minha reflexão disse, para comigo, assim não vamos lá.
Com o decorrer do tempo percebeu-se que o poder laranja tinha feito o grande contrato que permitia ao diretor executivo, que ainda hoje mais de 99% da população não conhece, usufruir de um ganho mensal muito superior ao do Presidente da República. É obra!!!!…e isto sem esquecer adjudicações, projetos e prestações de serviços que, pelos vistos, vão muito além dos 400.000 euros.
Pedi explicações nos órgãos onde apresentei as moções de apoio, pois verifiquei que a sociedade viva, a tal que cria economia e dinâmica, não foi ouvida e nem tão pouco envolvida, o mesmo acontecendo ao mundo associativo, chegando-se ao cúmulo de esquecerem inúmeros autarcas, criando apenas mais valias consideráveis, segundo eles, nalguns docentes da UBI, da Universidade de Salamanca e uma mão cheias de empresas, muitas delas completamente desconhecidas na cidade e no país. C’os diabos…
Em face de tudo isto, em junho de 2020 apresentei na Assembleia Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela um apelo para que o poder político da Guarda arrepiasse caminho. Terminei assim, e passo a citar: «A Guarda merece ser Capital Europeia da Cultura e nós merecemos sentir que estre projeto tem alma e coração para vencer. Caso contrário, não passa de um “fait-divers” leviano sobrando para depois as inevitáveis leituras e a obrigação de assumir todas as responsabilidades por parte dos intervenientes diretos. Este não é seguramente o caminho. Estamos já com muito pouco tempo para inverter o sentido de marcha. Oxalá esta e outras chamadas de atenção resultem em algo mais, pois se assim não for a nossa posição resumiu-se, apenas e tão só, a uma mera perca de tempo». Hoje acrescento ao tempo o dinheiro.
Nas comemorações do 57º aniversário do Centro Cultural da Guarda, onde esteve presente todo o executivo da Câmara da Guarda, voltei a realçar a importância do projeto criticando o rumo que estava a ser seguido. E, pelo que se ia ouvindo, a unanimidade existia: “Assim não vamos lá. Este não é o caminho”, pois percebia-se nitidamente a feira de vaidades, teimosia, megalomania, sobranceria, de quem não tinha um projeto sério nem nunca esteve à altura de conduzir esta candidatura.
A última referência vai para a intervenção precipitada, incoerente e sem consistência do tal diretor executivo, mesmo antes de rumar a Lisboa, para a apresentação da candidatura, adivinhando-se aquilo que seria obviamente a nossa não admissão à fase seguinte.
Depois de tudo o que aconteceu, as perguntas colocam-se e os guardenses têm o direito de saber: O que fazer ao investimento feito? Quanto custou esta candidatura? Quanto se gastou pormenorizadamente com uma candidatura que estava votada ao insucesso? Alguém vai assumir política e publicamente as culpas, e são muitíssimas, ou cobardemente vão assobiar para o lado?
Se assim não for, haja coragem de assumir todas as responsabilidades e consequências, humildemente peçam as necessárias desculpas, quiçá, se tiverem uma pinga de vergonha, embrulhem-se nesta folha de jornal, levem umas brasinhas da lareira que alimentaram e vão fazer definitivamente o inferno para outro lado…

Sobre o autor

Albino Bárbara

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