1. Passou quase desapercebida, mas a declaração do Presidente da República, na passada segunda-feira, referindo que se os incêndios de 2017 se tivessem repetido teria dissolvido a Assembleia da República, tem enorme relevância. Foi o recordar o que o próprio disse, e foi essencialmente um assumir, tardio de que tinha de ter havido responsabilização de tudo o que correu “mal” em 2017.
Em primeiro lugar, Marcelo Rebelo de Sousa devia mesmo ter dissolvido a Assembleia da República, porque morreram mais de cem pessoas e um terço do país ardeu sem que ninguém assumisse a responsabilidade política pela tragédia; depois, o governo esteve mal em toda a linha, com o primeiro-ministro a descartar responsabilidades e a responsabilizar a população incapaz de se defender da incúria de anos e do abandono a que foi votada pelo Estado; depois, porque, como se viu na postura de uma ministra que não só recusava demitir-se, como enjeitou qualquer responsabilidade, quando governar é decidir e é assumir responsabilidades; e porque a hierarquia dos serviços de proteção civil, comprovadamente, não era mais do que um amontoado de tachistas dos partidos do arco do poder, “jobs for the boys”, de gente incompetente, mal preparada e incapaz de gerir as situações de risco – milhões de euros atirados para as labaredas e uma gestão ruinosa dos meios e negligente resposta ao fogo, à morte, ao maior crime ambiental sofrido pelo país. Em segundo lugar, porque o país tinha o direito e o dever de julgar, pelo voto, a gestão e ação política na maior tragédia ocorrida em Portugal neste século – a desresponsabilização, como sempre, é a única sinopse que encontramos quando olhamos para trás: a culpa morreu solteira, mais uma vez.
Independentemente dos méritos de António Costa ou do governo nas ações posteriores (e tem havido, finalmente, muitas medidas para evitar o flagelo dos incêndios, da limpeza à vigilância, passando pelo controlo das queimadas, a origem da maioria dos fogos), não podemos esquecer o que ocorreu. Devemos relembrar as vítimas. Devemos recordar o cheiro a terra queimada. Devemos enaltecer a solidariedade do povo para com as vítimas (e lamentar a falta de celeridade para levar a ajuda a quem a precisou). E devemos, a cada primavera, denunciar o que falhou para evitar os habituais erros no verão seguinte. E agora, que estamos no fim de um inverno atípico (cada vez mais secos e quentes) é tempo de olhar para o próximo verão e prevenir.
2. Na próxima sexta-feira, um pouco por todo o mundo os jovens vão sair à rua contra o conformismo, contra o aquecimento global e em defesa do planeta, da cidadania e da vida coletiva (mais de 70 países associaram-se a esta “marcha” pelo futuro). Será uma “greve climática”, iniciada pela jovem sueca Greta Thunberg, que quer envolver os adolescentes na defesa de um futuro sustentável. Estranhamente, ou talvez não, em Portugal a mobilização aparentemente não está a conseguir atrair as escolas – que é onde a educação ambiental deve ser promovida. A primeira Greve Climática Estudantil deverá ter concentrações em 26 cidades (na região, infelizmente, que se saiba, apenas terá adesão na Covilhã e Fornos de Algodres), mas é estranha a falta de mobilização escolar. E mais estranha ainda é a falta de sensibilização em especial da comunidade educativa, dos professores aos encarregados de educação. Entre nós, parece que o ambiente ou as alterações climáticas continuam a ser matéria que diz respeito aos outros quando devia ser um desiderato de todos. «Vamos sair à rua», devia ser o apelo nas escolas em defesa do clima, do ambiente e do futuro.