1. António Costa cometeu um grande erro político. Atingiu um dos principais segmentos eleitorais do PS: os pensionistas. Em vez de aplicar a lei de atualização das pensões, que ditava aumentos de 7 a 8% para o ano (Costa dixit), o primeiro-ministro preferiu fazer um número de ilusionismo. É verdade que no final de 2023 os pensionistas terão recebido o mesmo com a fórmula agora apresentada – um bónus de meia pensão em outubro e aumentos de cerca de 4% para o ano. Porém, esta fórmula representa um corte futuro nas pensões, porque os aumentos para 2024 se fazem a partir de uma base menor das pensões.
Não discuto o mérito da medida. Compreendo até a prudência do governo. Inflação elevada e persistente, subida das taxas de juro, ameaças de recessão para o ano, guerra na Ucrânia, dívida pública (e privada) estratosférica, etc. Isto não está, de facto, para brincadeiras. Posto isto, é simplesmente mentira dizer que os pensionistas não são prejudicados. Claro que são.
Cabe à oposição mostrar, de forma simples, o que está em jogo. António Costa e o governo fazem mal em continuar a lançar nevoeiro sobre o assunto das pensões, aproveitando-se da iliteracia financeira de muitos portugueses. Felizmente, em Portugal, ainda há muita gente que sabe fazer contas e, provavelmente, são cada vez mais os que começam a não achar piada nenhuma à famigerada “habilidade” do nosso primeiro-ministro.
2. “Never complain, never explain”. Até ao fim, Isabel II manteve-se fiel a esta máxima. Nunca se queixou, nunca explicou. Já não há líderes assim. Fica o seu exemplo, um exemplo de sentido do dever. Era uma ilha de estabilidade e segurança no meio de um mar de mudanças e incertezas. Muito justamente, os súbditos prestam-lhe as devidas homenagens. E por todo o lado diz-se que “morreu a rainha”, como se o seu reino fosse muito além dos 16 países de que era chefe de Estado. No fundo, continuamos a gostar de histórias com príncipes e princesas, reis e rainhas. A monarquia tem um glamour e uma magia a que nenhuma república poderá alguma vez aspirar. Só assim se compreende os dias e dias, as horas e horas de cobertura mediática, que nenhum outro líder internacional suscitaria.
Em Portugal, sou um republicano convicto. No Reino Unido seria, provavelmente, um monárquico. Até porque sem reis e rainhas o Reino Unido não sobreviveria e no seu lugar dificilmente nasceria uma “República Unida da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte”.
Esta monarquia tem mil anos. Mas nada é eterno. Se Roma acabou, tudo acaba.
3. Dez dias antes tinha morrido outro famoso nonagenário: Mikhail Gorbatchov. É sem dúvida uma das personalidades mais importantes do século XX. A “perestroika” (reestruturação, reconstrução) e a “glasnost” (transparência) aceleraram o fim de um dos regimes mais execráveis da história da humanidade. Enfim, Gorbatchov não conseguiu reformar a irreformável União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Mas, como muitos sublinharam, o último presidente da URSS fica na história não pelo que fez, mas pelo que se recusou a fazer. Quando as coisas se descontrolaram, disse não a uma repressão brutal, não mandou os tanques para cima do povo como os seus antecessores haviam feito, evitou um banho de sangue, e a URSS caiu de um penhasco. Hoje, milhões e milhões de pessoas de vários países vivem em democracia graças à decência deste homem. Não é coisa pouca.
Fim de estação
“Felizmente, em Portugal, ainda há muita gente que sabe fazer contas e, provavelmente, são cada vez mais os que começam a não achar piada nenhuma à famigerada “habilidade” do nosso primeiro-ministro. “