Falemos do hospital, então

“Todos discursaram, todos prometeram e a todos as forças(?) locais prestaram reverência.
20 anos depois, que realidade temos?”

Quando recebi o convite para escrever este texto para ajudar a assinalar o 21º aniversário d’ O INTERIOR, ocorreu-me de imediato comparar a realidade do tempo em que assinei a minha primeira crónica, em agosto de 2001, com o atual.

Escrevi na altura:

«A Guarda não vai, de facto, ter hospital novo nenhum, vai, isso sim, receber uma série de remendos e acrescentos e acabar de destruir a sua mais bela mata. Vai hipotecar qualquer outra solução pelos próximos 50 ou 60 anos…»

Falemos do hospital, então.

Em 2000 ainda não existia esta coisa chamada ULS da Guarda, E.P.E. Havia o Hospital de Sousa Martins também chamado Hospital Distrital da Guarda e discutia-se a necessidade de um novo hospital para a Guarda.

Maria do Carmo Borges e Ana Manso digladiavam-se na arena política e o hospital era a principal arma, se bem se lembram.

Enquanto uma garantia o financiamento a outra prometia o terreno. Só mais tarde veio a tese da remodelação, da 1ª fase e da 2ª e da 3ª e da 4ª e da 5ª (no momento atual penso que vamos aí pela 1ª fase e meia).

Entre garantias e promessas, ao longo dos anos, lá foram conseguindo trazer à Guarda umas personagens mais ou menos mediáticas para ir alimentando a novela do hospital: passaram por cá Correia de Campos, ministro da Saúde (que partiu uma cadeira); José Sócrates, primeiro-ministro, “engenheiro” e “escritor” (que arrancou uns suspiros em damas já um bocado entradotas); Patinha Antão, secretário de Estado do PPD que veio inaugurar uma exposição de fotografia e saiu com o rabo entre as pernas; Duarte Pio de Bragança, rei que veio reinar; Manuel Teixeira, secretário de Estado da Saúde que foi o que se pôde arranjar para vir dar posse a Ana Manso; Fernando Regateiro, presidente da ARS Centro que não veio fazer coisa nenhuma e outros que a memória não reteve.

Todos discursaram, todos prometeram e a todos as forças(?) locais prestaram reverência.

20 anos depois, que realidade temos?

O que mudou: foi construído 1/3 de hospital e o pessoal está 20 anos mais velho. Morreram alguns, reformaram-se muitos, entraram poucos e os velhos cegam porque o conselho de administração proibiu os oftalmologistas de os tratar (esta última não tem pinga de ironia; é mesmo assim).

O que não mudou: PS e PSD continuam a mandar nisto; os conselhos de administração continuam a seguir uma lógica de escolha partidária (PS! PS! PS!); a maternidade, a medicina interna, a cardiologia e a pediatria ocupam os mesmos locais de há 20 e 30 anos; os pavilhões velhos continuam em ruínas; o pavilhão 5 sofre de senilidade precoce; e o futuro do hospital vai com certeza ser um dos temas centrais da próxima disputa eleitoral, onde se deseja que surjam candidatos (ou candidatas) verdadeiramente interessados no bem da sua terra, na paz no mundo e na cura para o cancro.

Daqui a 20 anos voltamos a falar.

Aqui, n’O INTERIOR.

PS: e não é que consegui escrever um texto sem falar daquela maldita coisa que nos persegue há 1 ano!!?

* Médico e antigo colaborador de O INTERIOR

Sobre o autor

António Matos Godinho

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