Encontros

Escrito por Diogo Cabrita

«Com o anúncio conheci 80 pessoas. Conheci de todos os tipos. Uma das vezes quem veio ter comigo era uma mulher»

Anabela Mendonça das Neves tinha 44 anos quando colocou um anúncio no jornal para casar. Procura-se homem sério, com estudos superiores, sem dificuldades económicas, para convívio com senhora de bem. Vida em comum.

Tive centenas de respostas depois do anúncio no “Diário de Notícias”. A maior parte eram disparates, gente muito nova, homens muito velhos, tipos casados e com filhos, desempregados, tatuados e com brincos, enfim, uma enormidade.

Vieram homens enormes, homens pequenos, tipos gordíssimos, outros esqueléticos. Os homens são como as raças de cão – há de todos os tipos.

Sorrisos.

Ri-me com ela! Recebi cartas com fotos de homens de terno, outros nus, outros masturbando-se. Selecionei pelas cartas e pelo primeiro telefonema – esse sim, esclarecedor e funcionando como triagem. Marquei oito dúzias de entrevistas, sempre na Avenida de Roma ou na Praça de Londres. Almocei na Isaura, na Anabela, na Mexicana, sempre ali na zona. Outras vezes era só um bolo e um café. Escolhi um fato azul, com uma carteira branca com risca azul e assim me fazia identificar. Normalmente eu esperava dentro dos lugares, para evitar que me reconhecessem antes da fala e chegava mais cedo.

Deve achar-me louca, mas sabe que a solidão é uma doença que nos amarrota por dentro. Saio do trabalho e vou para casa, não conheço ninguém no metro, não conheço nenhum vizinho e nunca fui às mercearias ali perto. Eu e a televisão. Falo consigo. Com o anúncio conheci 80 pessoas. Conheci de todos os tipos. Uma das vezes quem veio ter comigo era uma mulher. Passámos três semanas a conversar. Era bonita, masculina, muito só e, entre a sedução de me conquistar e a vida que ia descrevendo, fiquei fascinada. Percebeu que não dava e desapareceu. Mas foi uma amiga de três semanas e despedimo-nos com um abraço. Disse-me o que queria, o desejo que a atormentava e partiu com o seu fascínio e um beijo que lhe dei.

Aquela atividade de ir conhecendo as pessoas que me respondiam ao anúncio durou mais de três anos. O anúncio durou dois meses, sempre à quinta-feira. Depois triei as pessoas e fui para as entrevistas. Isto dava um livro.

Sobre o autor

Diogo Cabrita

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