Com eleições marcadas para 10 de março, a palavra vai ser devolvida ao povo. Certo?
Não é inteiramente assim. Se por um lado o sistema democrático português funciona com eleições livres e universais, cuja seriedade nunca foi posta em causa, por outro lado há uma deficiente representação parlamentar da maior parte do território nacional. Pior do que isso: há um enorme desperdício de votos que para nada contam se o partido escolhido não for o PSD (ou agora a AD) ou o PS.
Em Lisboa, qualquer voto nos nove partidos parlamentares pode ajudar a eleger um deputado. Assim, quem quiser que o PS ou a AD governem sem maioria absoluta pode votar, nos grandes círculos, no PCP, no Bloco de Esquerda, no Livre, no PAN, na Iniciativa Liberal ou no Chega.
O problema é que nos círculos pequenos, até seis deputados – o que inclui os círculos da emigração (Europa e Fora da Europa) – qualquer voto que não seja na AD ou no PS irá para o lixo. Não é pouco país: falamos da Madeira (6) e dos Açores (5), de Viana do Castelo (5), Vila Real (5), Bragança (3), Guarda (3), Castelo Branco (4), Portalegre (2), Évora (3) e Beja (3).
Meio país só vai poder eleger deputados do PS ou da AD. Esta disfunção tem várias origens. Uma delas são os distritos, uma realidade que já quase não existe, para pouco mais serve a não ser para eleger deputados. É preciso criar novos círculos eleitorais, e as comunidades intermunicipais (CIM) e as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, por serem recentes e corresponderem a uma efetiva gestão partilhada de um território, são boas hipóteses.
Outra boa hipótese é o exemplo dos Açores para a Assembleia Legislativa Regional. Cada ilha tem direito a dois deputados, depois mais um por cada 7.250 eleitores ou fração superior a 1.000, e há um círculo de compensação para os “votos sobrantes” (que não contribuíram para eleger nenhum deputado), o qual elege cinco deputados e protege desta forma a representatividade dos pequenos partidos na região.
O presidente da Associação para uma Democracia de Qualidade, José Ribeiro e Castro (ex-presidente do CDS), defende outro modelo para o país, inspirado na Alemanha: propõe a eleição de 105 deputados em círculos plurinominais, outros 105 em círculos uninominais, quatro mandatos afetos às comunidades portuguesas e 15 mandatos num círculo nacional de compensação e repescagem dos votos não usados para eleger deputados.
Qualquer dos modelos tem o mérito de pôr a (quase) totalidade dos votos a contar para eleger deputados. É preciso debatê-los. Esta é uma questão que urge!
* Presidente do Conselho Distrital da SEDES Guarda