Há dívidas e dívidas. Umas mais necessárias que outras. As dívidas obedecem a um contrato. Há dívidas que causam descontrolo. Quando contraímos uma dívida temos obrigatoriamente de a pagar, mesmo percebendo que podem existir juros e outros impostos e que o credor, mesmo negociando, espera pelo pagamento que pode ser na íntegra ou faseado, num processo que tem de ser justo para ambas as partes. Falta ainda referir que há dívida a curto, médio e longo prazo e a melhor coisa que nos pode acontecer é prevenir o endividamento, pese embora se perceba que por vezes é impossível. Como resultado ficamos reféns dela, durante muito tempo, por vezes dezenas de anos.
Em 1991 foi contraída uma dívida política que até ao momento (ainda) não foi paga. A fatura chegou agora, 30 anos depois, com juros, hipoteca, letras, livranças e outras coisas tais. Soares foi PR com o apoio de Cavaco e de todo o seu laranjal. A dívida nunca foi cobrada e, naturalmente (ainda) existe. Vai ser paga por todos aqueles importantes rosáceos que se dizem republicanos, de esquerda, socialistas, laicos, que deixaram de cantar a Internacional, alinhando neste pagamento que, em janeiro, ficará saldado.
A juntar a tudo isto temos de adicionar o agradecimento e a gratidão. Agradecimento à proximidade com o PS. À solidariedade institucional, à cooperação entre órgãos de soberania, à máxima responsabilidade pelo que o Governo fez, à visão do Estado Social, da escola pública, da regionalização, da saúde, do apoio à geringonça e ao governo regional dos Açores, ao fim dos debates quinzenais, ao folhetins de faca e alguidar, às historietas de cordel, à palhaçada (que, pelos vistos, se irá repetir) na AutoEuropa, à popularidade dos beijos, abraços e selfies, ao comentário inapropriado, à monopolização de todos os pilares republicanos, neste apoio de (quase) todos os nomes sonantes do país, da direita à esquerda, empresários, sindicalistas, fazedores de opinião, burgueses, vilões, barões e às vezes, num processo de unicidade, de uma (quase) União Nacional, no apoio ao mais alto magistrado da nação, percebendo que para este segundo mandato, tal qual aconteceu com os antecessores, (quase) nem é preciso haver eleições. Bastam eles, todos eles, as sondagens e o etc. Tá no papo.
Nesta apreciação extremamente subjetiva cabem todas as estratégias que possam vir a desencadear processos, a partir dos quais haverá desenvolvimentos sociais e políticos, onde a pandemia entra, exigindo de futuro o respeito pelos mais pobres, vulneráveis e pelos trabalhadores deste país.
Fazendo as contas da gratidão, a dívida ficará paga e todas estas atitudes cúmplices, seguidistas, politicamente corretas, mas extremamente redutoras do regime, irão fazer com que haja outras, novas e diferentes posturas democráticas, outros, novos e diferentes atores, pois se assim não for termino, fazendo minhas as palavras de Eça: «É com verdadeira alegria que me acho neste canto que a política me deixa. Faço deste canto de boa vontade o lugar de espectáculo para assistir às últimas agonias do pensamento em Portugal».