Pandemia (pan=tudo/todos+demos=povo) é uma doença infecto contagiosa que se espalha entre (toda) a população.
A verdade atrás enunciada relativa a fé nas “cercas sanitárias” enquanto espaços geográficos, maiores ou menores livres (ou libertáveis) da crise.
O saltar do muro pela doença é uma questão de tempo.
Tempo que numa primeira fase é importante para adaptar as instituições de saúde para o embate que se segue.
O aplanar da curva de que falamos.
Mais eficaz, mais duradouro, mais ético e a consciencialização cívica de todos nós e a adoção de boas práticas independentemente do local de origem, grupo social, profissão-todos somos iguais nesta capacidade de disseminação do agente (coronavirus) se não adotámos regras de segurança e isolamento social. Transversal a todas as fases é a rigorosa higiene pessoal, dos equipamentos e regras de isolamento social.
O enfoque deve ser transferido da velha noção “grupo de risco” para comportamento de risco. (A crise já dá um bom contributo se deslocarmos o nosso foco de quem somos para o que devemos fazer). O nosso olhar só deve recair sobre um grupo específico, agora e sempre, se apresentar fragilidades que devemos corrigir – grupo vulnerável.
Esta pandemia, como as anteriores, também os vai mostrar: idosos, sem abrigo, etnias vulneráveis, migrantes, … – bem vistas as coisas – sempre os mesmos. Até parece que somos cegos, surdos e mudos.
Com estes pressupostos esta pandemia, porque larga em extensão e concentrada no tempo causa terror e medo. Temos para lhe contrapor conhecimentos técnicos, equipamentos médicos, equipamentos de proteção individual, cooperação internacional e coragem e solidariedade como diz o General Ramalho Eanes. Todos temos um papel a desempenhar. Como diria a Amália Rodrigues “Povo, povo eu te pertenço…” e de ti dependo, acrescento eu.
Sabemos que este agente tem grande infecciosidade – capacidade de infetar – e resistência – vai andar por aqui bastante tempo (um ano? Ou mais?) atacando por duas ou três vagas, jogando com a nossa distração.
Toda a atenção é pouca. A atenção deve ser redobrada no nosso Distrito aos idosos – institucionalizados ou não. Reforçar o cuidar, planos de contingência no papel e na cabeça de todos nós, reforço de meios de proteção dos cuidadores, interajuda técnica e comunitária, assistindo e cuidando, sempre que possível, no local onde sempre se sentiram bem – as exceções apenas se justificam se o estado clínico justificar cuidados diferenciados hospitalares.
O teste à nossa Alteridade (bondade/compaixão) vai ser a forma como lidamos com os que ficam para trás – morrem.
A besta tira-nos a vida (social) – O homem é um ser eminentemente social. Tira-nos também a morte – a despedida – o luto sem corpo (o pior de tudo), sem companhia, sem culto. Cicatriz funda e duradoura na alma de um povo. Na pandemia de 1918/1919 a ferida que mais tempo perdurou.
Esta crise interpela-nos a um balanço:
1- Estamos conscientes que um Serviço Nacional de Saúde Universal, acessível e de qualidade é uma necessidade de ontem, hoje e amanhã? Fica claro, ou não, que o nosso tecido económico deve ser constituído pelo setor Primário, Secundário e Terciário, ou queremos, num futuro próximo, (como hoje), depender de produtos essenciais e mesmo de simples máscaras de caridade alheia?
2- É evidente (ou ainda não chega?) que a arrogância/ individualismo e isolamento dos povos não responde a problemas globais? Problemas globais exigem soluções globais e cooperantes.
3- Perceberá o Homem que o seu avanço destruidor sobre os hábitos naturais e destruição da vida selvagem (como foi o caso) se vai pagar com “língua de sete palmos”?
4- Entende a União Europeia que ou cresce ou morre?
5- Ficará uma sociedade de homens mais livres, conscientes da sua fragilidade e solidários ou mais vigiada, nomeadamente por novas tecnologias?
6- No final da devastação socioeconómica vai emergir uma sociedade mais justa, equitativa em democracia (crente em todos nós), ou com fé em falsos Messias?
Socorro-me do ânimo e confiança de Pedro Barroso, que recentemente nos deixou sem despedida condigna, para terminar
“ dos que fazem Portugal/no trabalho dia a dia/e me dão alma e razão/nesta porfia…”.
P.S: Não há tempo de alinhar ideias nem elaborar textos alinhados
* Médico, Delegado de Saúde da Guarda