Contra as portagens

“a luta pela abolição integral das portagens faz sentido e não pode parar”

Há 12 anos, no seguimento de uma Petição Pública de que fui autor e promotor, defendi na Assembleia da República a eliminação das portagens nas ex-SCUT A23 e A25 – cuja implementação foi feita em 2011, num processo decidido pelo governo de José Sócrates, pouco antes de pedir o resgate financeiro e da chegada da Troika, e que seria executado pelo governo de Passos Coelho.
Ancorado em quatro mil cidadãos que subscreveram a Petição, procurei demonstrar então o atentado e a injustiça que representava a introdução de portagens. E como aqui escrevi (https://ointerior.pt/arquivo/contra-as-portagens/), «não defendemos a excecionalidade por sermos uns coitadinhos, mas por elementar Justiça», a falta de alternativa, os custos de contexto ou a distância contribuiriam para agravar as assimetrias e as dificuldades de desenvolvimento dos territórios do interior. Como eu, também a Plataforma contra as portagens foi então recebida na Assembleia da República contestando a implementação de portagens e o aumento de desigualdades entre o interior e o litoral. E foi com essa mobilização iniciada ainda em 2011, repudiando a instalação de portagens e nunca desistindo da contestação, e mantendo ao longo destes 12 anos o assunto em agenda e a reprovação do custo extraordinário que significou para o interior o portajamento nas autoestradas, que se conquistaram descontos no preço das portagens (assim se conseguiu um desconto até agora de 50 por cento) e foi com essa pressão que agora se conseguiu mais um desconto – na verdade, foram 12 anos em que as portagens contribuíram para encarecer os custos das empresas fixadas nos territórios de baixa densidade e assim dificultar a vida a quem escolheu ficar no interior, foram 12 anos em que o despovoamento cresceu e a capacidade de atrair empresas ou investimentos foi dificultada. Agora, 12 anos depois, já nem vale a pena defender a fixação ou o regresso dos que partiram, mas, ainda assim, devemos acreditar que com menos custos de contexto (redução ou eliminação das portagens) será possível atrair visitantes e turistas e assegurar algum dinamismo económico essencial para a sobrevivência da vida local. Muito mais do que os políticos, foram os cidadãos, os sindicatos ou as associações empresariais que se mobilizaram e não baixaram braços nesta luta contra as portagens.
A redução em 30 por cento do preço das portagens a partir de janeiro vai aumentar de 50 para 65 por cento, face ao preço de 2011, o desconto em portagens de vias pagas situadas no interior do país ou em zonas em que não há alternativas viáveis. Esta medida estava inscrita no Orçamento de Estado de 2023, uma promessa que não é cumprida este ano, mas será em 2024. Com atraso, é um desconto que chega tarde, mas permite uma enorme poupança a todos os que vivem ou trabalham nas regiões abrangidas pela medida. E confirma que a luta pela abolição integral das portagens faz sentido e não pode parar. Se estão de parabéns os que não desistiram nestes 12 anos, fica o repto para manter o sentido de contestação e a luta por autoestradas gratuitas, porque foram contruídas para desencravar o interior e porque não existem alternativas viáveis.
O desconto agora aprovado é o cumprimento de uma promessa de António Costa e vem repor um mínimo de justiça para com os territórios de baixa densidade. As boas estradas trazem e levam… mas sem boas infraestruturas não é possível ambicionar alguma forma de desenvolvimento. O Interior de Portugal devia ter uma autoestrada de Bragança a Vila Real de Santo António (o IP2), que incluísse boa ligação entre Bragança e a Guarda e entre Castelo Branco, Portalegre, Évora, Beja e o Algarve. Mas Portugal está demasiadamente inclinado para o eixo Lisboa-Porto. E o resto é paisagem. O governo do superavit faz uns descontos por pressão, mas não consegue assumir o país como um todo!

Sobre o autor

Luís Baptista-Martins

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