De mim para comigo tinha decidido não voltar a escrever sobre o fenómeno destes tempos modernos que nos têm conduzido ao já mais que estafado “novo normal”. Mas, como outro dos futebóis já dizia, “o que hoje é verdade amanhã é mentira”. E foi isso que aconteceu. Estava decidido a cumprir e eis que surgem dois factos que me levaram a dar um passo atrás. Quando pensava que já nada conseguiria surpreender-me…
1. Dias atrás foi aplicada a vacina contra a Covid-19 ao primeiro idoso, utente de um dos lares da cidade mais alta. Facto devidamente noticiado pelos órgãos de comunicação social do burgo. Nada de especial dado tratar-se de matéria atual, logo passível de ser notícia.
O que se estranha, eu estranho, é que, para assinalar o facto, uma comitiva de mais de uma dúzia de pessoas, entre as quais reconheci representantes do poder local e de serviços desconcentrados da administração central, se tenha deslocado ao lar. Bem poderão argumentar que todas as medidas de segurança (próprias e dos utentes) foram cumpridas, que foi mantida a distância de segurança, que… e que…
É que eu também argumentei deste e de muitos outros modos para tentar visitar o meu pai. Entretanto ele morreu (não tenhamos medo das palavras: morreu mesmo, não partiu como é agora moda metaforizar). E morreu sem eu lhe poder dizer, olhos nos olhos, uma última vez, o quanto gosto dele.
Como os leitores devem compreender, não sinto ter sido tratado da mesma forma no que toca a isso dos direitos e dos deveres. Ainda por cima quando boa parte dos elementos da comitiva têm, de uma forma ou outra, responsabilidades públicas que os deveriam inibir de mostrar estas, como dizer?… excentricidades.
2. No passado domingo, em Braga, um grupo, dizem que de quase duas centenas de pessoas, juntou-se para jantar. Uns que era apenas um jantar de aniversário. Outros que não senhor, que se tratava de um jantar comício de um dos candidatos à Presidência da República do país (ouvi-o mesmo agora) com maior taxa de novos casos por milhão de habitantes registada na semana passada e em que mais de metade dos concelhos estão em risco extremo.
Cabem, perante tal ato, algumas perguntas que, bem o sei, ficarão sem resposta dos seus responsáveis, mas que, ainda assim, deixo no ar:
Não estão os comensais obrigados às mesmas medidas de confinamento que eu e mais os restantes dez milhões de portugueses?
Não estará o espaço onde decorreu o manjar sujeito às mesmas restrições que outros milhares desses espaços estão, de norte a sul do país?
Como, ou quem, poderá explicar o atrevimento desse candidato (do qual não quero sequer escrever o nome) de, em plena pandemia, permitir que tal encontro se realizasse? Não me venham com a costumeira resposta do “foram cumpridas todas as normas de segurança”…
Porque é que, no dia seguinte ao tal jantar, é identificado o dono do espaço e, que eu saiba, os seus organizadores passaram pelos pingos da chuva?
Foram aqui retratadas apenas duas situações, mas, a avaliar pelo sucedido por parte de pessoas com responsabilidades bem maiores que as do vulgar cidadão, só poderemos concluir que: Estamos tramados!!!…