Com a “Estrela Polar” contra o peito, agarro-me aos raios de sol que se demoravam na Praça da «cidade escura, negra de inverno e velhice» e recordo-me do primeiro dia em que subi ao topo da Catedral. De olhos postos no céu, brindado pelas cores de uma despedida luminosa, vi o que só se vê quando se chega ao cume de uma montanha. Prometi, então, a Vergílio, de olhos molhados e inundada de certeza interior, lutar pelas suas palavras perenes: «essa cidade Velha, de lentos fantasmas ferrugentos, há-de elevar-se para sempre perto da estrela polar». O que se escreve no tempo traça o seu destino, desde que alguém o leia.
Por entre pináculos majestosos, percebi que somos muito maiores do que nos fazem crer e que há um caminho de luz que não se vê do chão. Nesse dia, aprendi que os poemas não se escrevem, os poemas já estão escritos à espera que alguém os encontre.
«Penalva é pequena, tudo se sabe, tudo se remexe», mas a altitude tem um segredo bem guardado – o de esconder o próprio Segredo. Desde então, a Guarda nunca mais me foi igual. A possibilidade de mundos que se revelaram num único pôr do sol fez em mim brotar a Filosofia da Cidade e a minha deambulação passou a ter um propósito. Vejo a cidade que ainda não se vê, a cidade invisível que me habita o sonho e que se quer destino. O lugar da imaginação concretiza-se com a criação e com a sede dos loucos, que fazem da ousadia fonte para a concretização – não é isto a Revolução?
Comunguemos do comum que nos une e lembremos-nos de que, antes de nós, já tantos sonhadores concretizaram a sua Guarda, em forma de foral, de castelo, de catedral, de portas e muralhas, de poema, de literatura, de escolas, de sanatório, de rádio, de teatro, de jornal, de biblioteca, de centro de estudos ibéricos ou de parque urbano.
Também nós seremos capazes de fazer a Revolução e de emergir desta longa noite que dura há mais de uma década.
Do alto da Catedral tocou-se um violino, enquanto um pintor inscrevia em tela o encanto da paisagem. Cantou-se a Liberdade, renasceu a livraria, a Aida e o Adalberto, o coreto espoletou no meio da Praça a pulsar de arte. O rei que nos fundou reassumiu protagonismo, reapareceram as bicicletas que circulavam por Penalva, a Mata voltou a ser caminho de sonho puro.
Perto da estrela polar irá elevar-se uma cidade, a mais próxima da luz, esta que se imagina com a exata medida da força de todos os nossos sonhos e vontades.
* Referências à obra “Estrela Polar”, de Vergílio Ferreira
Muito bem Dianinha, continue assim Será sempre uma lufada de ar fresco quandos lemos textos de verdade com suavidade. Beijinho António Isidoro Cumprimentos aos papás. 🙂