Caveant Consules*

Por um tempo, não se sabe quanto, o Homo Sapiens foi apeado. Não está no topo da cadeia biológica. Agora, está lá um vírus. Por isso deixámos de ter teoria económica. Estamos como os meus cachorros, sem teoria económica própria. A dos meus, Farrusco e Valentim, é a minha, produto convolucionado com a deles.
A nossa teoria económica, hoje e enquanto perdurar o vírus, é a economia do vírus convolucionada com a Teoria que tínhamos. E a economia do vírus exige, consome dos Humanos, a saúde e a nossa Vida. Na Teoria Económica dos Humanos, por um tempo, nada funciona e nada resulta, nem as comparações com o passado. Assistir aos debates sobre teoria económica é apercebermo-nos que o que se sabia não é aplicável enquanto durar esta subjugação biológica. Estamos numa singularidade em que se tem que clarificar a realidade sem Teoria. Temos que o fazer com a vida, a visão prática do futuro imperfeito de todos os dias e com ensinamentos da História.
Sabemos apenas que a economia deste vírus se alimenta de nós. Este novo coronavírus e os outros seres de evolução molecular atacam-nos a esse nível profundo. Hoje talvez já saibamos o suficiente da linguagem química da evolução molecular e da evolução da vida para um dia lhe fazer, decidida e decisivamente, frente.
Hoje sabemos que qualquer inflamação é a âncora nas células humanas para que as moléculas que constituem o vírus se reproduzam no seu interior e as destruam. Ora inflamações temos por todo o corpo, sobretudo quando se começa a aplicar a sabedoria da minha Avó Joaquina (Ti Jaquina Vasca, 1870-1972). Um dia em que não foi tão ágil como julgava que ainda era, com olhos em baixo, disse: «Olhai filhos, isto de ser velho é um perigo». É, vêm inflamações por todo o lado. Em particular as inflamações nos vasos por onde correm os fluídos necessários à nossa vida. Talvez venha daí que o novo coronavírus pode estragar, em todas as idades, tantos e tão variados dos nossos órgãos, incluindo necrosar os pés.
Por causa da evolução molecular e para que cada um possa seguir, especialmente agora, o conselho muito recente de quem sabe (Dr. Manuel Pedro Magalhães, diretor clínico do Hospital da Cruz Vermelha Portuguesa) porque todos os dias faz Medicina: «Comportem-se como se estivessem infetados», Caveant Consules.
O vírus flui nas estradas do nosso corpo. E vai também connosco, dentro de nós ao nível celular e molecular, nas estradas terrestres, marítimas, aéreas e do espaço exterior. Só lhe está vedado percorrer as estradas das telecomunicações que são estradas do Tempo. Aliás, tem sido lá, nessas estradas, que temos tido refúgio. É no telemóvel, na web, no skype, zoom, etc…. Só nessas estradas do tempo, i.e., das telecomunicações, é que há economia tal como a idealizámos porque nessas estradas não vamos nós, só andam por lá os nossos pensamentos suportados em imagem e linguagem.
Nas outras, nas estradas da Terra, do Mar, do Ar e do Espaço exterior, vamos nós. Aí reina a tal nossa teoria económica convoluída com a economia do vírus, que nos deixa perplexos. Precisamos de um novo guia para os perplexos. Não vai haver o Sefardi Moshe ben Maimon, Maimonides, já ninguém o vê faz oito séculos.
O vírus está por aí: matou 174 mil na Europa, 106 mil nos E.U.A.. A economia do vírus traga dos Humanos, a Vida, a nossa Vida. O consumo para o vírus, na economia dele, vírus, é o consumo da nossa saúde e das nossa vidas. A economia dele vírus ordenou-lhe e impôs-nos a nós, sacrifícios terríveis que a 1 de Junho 2020 e por um milhão de habitantes eram: São Marino, 1.238; Bélgica, 819; Andorra, 660; Espanha, 580; U.K., 575; Itália, 554; França, 442;
Suécia, 436; Sint Maarten, 350; Holanda, 348. Nos E.U.A. 322, em Portugal 140 e na Alemanha 103.
É um sinal, que na Europa, os Estados, com várias nações em desagregação, liderem a economia do novo coronavírus com mais de 550 mortes por milhão de habitantes. Constituem a nossa vizinhança mais próxima.
E, pelas estradas anda, flui, o vírus, garrote na nossa economia de vida convoluída. Por isso, com um milhão de infetados ativos na Europa, outro milhão nos E.U.A., as junções de autoestradas, de caminhos de ferro, os portos e os aeroportos são os centros de confluência, comunicação e difusão do vírus.
Em especial, para que aqui o nó, de rodovias e ferrovias, da Guarda, do seu concelho e do seu distrito, não se transforme e venha a funcionar como o canhão da Nazaré para a segunda vaga do vírus: Caveant Consules.
Mas, economia do vírus convolucionada com a do Homo Sapiens Sapiens apanha-nos num momento único. Em pouco mais de cem anos construímos uma sociedade eficaz ainda que à custa de cada vez mais consumos obrigatórios.
Os sistemas de suporte à vida: água, alimentos, energia são entregues a cada um onde nos encontremos a viver. Na sociedade eficaz levam o lixo da casa de cada um. Eliminámos também a redundância no modelo eficaz. Há cem anos, com exceção das profissões (ferreiro, carpinteiro, alfaiate, etc.), todos podíamos desempenhar as funções de qualquer um. Hoje, há funções críticas que levam muitos anos de formação profissional, de estudo e prática.
Os meus, os nossos, antepassados viveram mal, mas sem quase um único consumo obrigatório. Casa não se pagava, água e alimentos também não, lixo era reciclado em estrume, eletricidade nem havia, licenças, taxas, etc. e etc. Hoje, na Sociedade Eficaz, vivemos sitiados, emparedados por eles, pelos pagamentos dos consumos obrigatórios.
A Sociedade é eficaz, mas o dinheiro para fazer face aos consumos obrigatórios só nos chega por vias exíguas e em condições muito limitadas. As fronteiras desse limite são desenhadas pelo consumo.
Mandam-nos, para salvar a Teoria Económica, que em tempo de vírus não é válida; mas mesmo assim afirmam com toda a certeza de que são capazes: consumam até ao sumiço. Sim, é verdade que alguns de nós vão morrer a bem da Teoria Económica porque só há dinheiro para muitos de nós se aderirmos ao consumo até ao sumiço. Dizem pela propaganda, ampliam os media e dão exemplos e a razão de assim ser: no consumo está a alegria, a libertação e, até, a felicidade.
Tudo é feito para que geremos dinheiro para fazer face aos consumos obrigatórios com que entretanto nos cercámos. Mas talvez hoje não fosse necessário que tudo, incluindo a vida, seja sacrificado por esta quase ordem, este grande plano: consumo até ao sumiço. Caveant Consules.
Talvez e hoje, em que na Sociedade Eficaz levamos água, alimentos, energia, tratamos do ambiente (recolha de lixo, jardins, etc.) a cada porta, pudéssemos, enquanto o vírus impuser sobre nós a ditadura da sua própria economia, levar, fazer chegar, também, dinheiro.
Talvez hoje em que nos cinco concelhos que, em Portugal, esgotam a maioria dos recursos e geram quantidades enormes de entropia e onde já se paga para eliminar o custo dos transportes porque os consumos obrigatórios são tantos e tamanhos que o que se ganha já não dá para ir de casa para o trabalho.
Talvez agora, que o dinheiro não tem suporte físico, agora que o dinheiro de cada um é a carga elétrica num condensador, agora… E pelo tempo que demorar esta subordinação molecular do Homo Sapiens Sapiens ao novo coronavirus será assim tão difícil que entreguem dinheiro para fazer face aos consumos obrigatórios que nos esmagam?
Nos E.U.A. durante três meses cada americano recebe na sua conta, sem preencher um documento que seja, 1.200 dólares. Um casal com dois filhos três mil. Nos E.U.A. o vírus, a economia própria do vírus, consumiu 60 por cento das vidas sacrificadas ao mesmíssimo vírus na Europa. É uma diferença enorme. Na Europa morreram mais 60 por cento do que nos E.U.A..
Na Europa não há engenharia para que as soluções funcionem na vida de todos os dias. Na Europa há a conversa oca e sonante para fazer que tudo se embrulhe em formulários e acabe por ficar só pelo papel, no caixote de lixo do papel, na realidade da vida muito, muito poucas vezes. Na Europa logo que algo exista no papel, num papel, fazem uma festa, gesticulam de tão avançados que estamos, e… na realidade nada há, nada acontece, nada muda.
Na Velha Europa – e “isto de ser velho é um perigo”, é tudo muito para além de complexo; é sempre tudo muito complicado e, como tal, muito vagaroso, assustadoramente lento. A Europa desenhou nos anos 90 do século XX a trajetória, e caminha desde então na ladeira do seu definhamento e irrelevância. Para que haja e tenhamos, por aqui, outros caminhos que não num monte de papel, mas na realidade, Caveant Consules.
A Europa, as Nações da Europa, são lideradas apenas por quem só tem ou teve ambição para o fazer. Estaria tudo bem, o da ambição, se exigíssemos, ao mesmo tempo, que tivessem ou tenham visão. Porque não o fazemos, não há réstia de visão. Há tática; a ambição tem sempre, se não uma tática, um esquema; não tem tido, nem se lhes vislumbra, em algum momento, estratégia.
Nos Estados da Europa está-se sempre em estudo e plano, muito pouco em ação. Em ação testada e treinada, raramente. Em ação antecipada, nunca. Na Europa fazem-se cimeiras, muitas. Os resultados são, em todas, os que se obteriam numa assembleia de cegos que debatesse e decidisse sobre as cores do arco-íris, por tudo, pela, nossa e vossa rica saúde: Caveant Consules ne quid respublica detrimenti capiat

# http://www.acad-ciencias.pt/document-uploads/4080505_[2020]-rueff,-j.-(coord)—sars-cov-2.pdf

* Escrito a 1 de junho de 2020, para as comemorações dos 20 anos de O INTERIOR, com a ortografia da Dª. Laura. Cada erro no ditado eram três reguadas. Não estou para me meter em sarilhos.

Sobre o autor

Fernando Carvalho Rodrigues

Leave a Reply