Bate-me no para-brisas uma borboleta grande. Ainda a vi inteira, asas abertas, com laivos negros e brancos, rápida a aproximar-se e desfazendo-se num ponto ténue da vidraça.
A borboleta é um inseto que associo a beleza e flores. No meu caso específico, prende-se de amores. Nunca mataria uma borboleta que entrasse no carro. Abria-lhe os vidros e deixava-a decidir. Se ficasse, observava-a com carinho. São diferentes das traças ou mariposas, que não são tão vistosas. As asas abertas das borboletas projetam beleza nos lugares onde voam destemidas. São atrativas e, portanto, facilmente descobertas pelos predadores. Os seus ciclos rápidos de vida só têm quatro fases: ovo, larva, pupa e imago. É agora que são belas e por muito pouco tempo. Vaidosas, atiram-se ao ar e contam suas histórias. Eu imagino que as pessoas que amo se transformam nelas e voam. Imagino que me visitam quando aparecem nas caminhadas. Imagino que me lembram momentos quando se aproximam. Não são pessoas mortas, são pedaços de alma que me visitam, acariciam, aconselham, interpretam. Ontem fiquei aterrado com a violência daquela chegada. De repente, estava pulverizada a borboleta que me queria falar. Não travo porque a vida não pára. Não lavo o vidro para que ressuscite. Abro as janelas para que venha outra a informar do que a anterior não conseguiu. Não veio. Quem seria? Que amor matei naquela viagem? Não, não morrem nunca os amores! As borboletas regressam inteiras e bonitas a trazer a recordação, a transportar a música dos romances, a colorir as visões mais amargas. Se não sorris quando elas chegam é porque não estás bem! Sorrio sempre, inclino-me para ver se voam, espero que se levantem e abram as asas carregadas de escamas. Há uma em particular que me recorda como viver é lindíssimo.
Borboletas
“As borboletas regressam inteiras e bonitas a trazer a recordação, a transportar a música dos romances, a colorir as visões mais amargas.”