As perguntas do desassossego

Escrito por Carlos Peixoto

“Perguntem aos comerciantes, pequenos empresários e profissionais liberais que dependem do pulsar do mercado e da “gravitas” dos seus concelhos se sentem maiores ou menores dificuldades em manter as suas atividades agora do que antes.”

Perguntem a cada jovem que está agora a candidatar-se ao ensino superior se vai privilegiar as instituições do interior ou do litoral do país. Perguntem-lhe logo de seguida se é seu propósito exercer a futura profissão em qualquer trato de terra dos distritos de Vila Real, Bragança, Guarda, Castelo Branco, Portalegre, Évora ou Beja, ou se intuitivamente declara querer rumar para outras geografias mais populosas ou até para o estrangeiro. Perguntem a cada cidadão que faça vida em zonas cosmopolitas se pondera mudar-se para as zonas rurais ou se nem quer ouvir falar nisso, mesmo que lhe acenem com um beneficiozinho monetário que mal dá para um café por dia. Perguntem a cada empresário sedeado mais perto do mar se algum Governo lhe ofereceu condições decentes para se deslocalizar para mais longe, ou se independentemente disso não quer mesmo mergulhar na aridez de mão de obra qualificada – e não só – que é timbre de quase dois terços do território nacional.
Perguntem à geração dos anos 60 ou 70 se hoje este nosso retângulo está mais ou menos equilibrado e atrativo do que antes. Perguntem a quem tenha nascido e vivido fora dos grandes centros se presentemente as suas terras têm mais ou menos pessoas. Perguntem às mulheres de Portugal se estão na disposição de ter mais ou menos filhos do que as suas mães e avós. Perguntem aos imigrantes que entram todos os anos no nosso território, inclusive àqueles que fugiram da guerra, se querem ficar por cá e, em caso afirmativo, se aceitam instalar-se em zonas de mais baixa densidade populacional ou se fogem delas na primeira oportunidade. Perguntem aos nossos emigrantes se vêm de férias a Portugal animar e repovoar as nossas vilas e aldeias como vinham há uns anos, ou se preferem outros destinos e outras dinâmicas.
Perguntem aos comerciantes, pequenos empresários e profissionais liberais que dependem do pulsar do mercado e da “gravitas” dos seus concelhos se sentem maiores ou menores dificuldades em manter as suas atividades agora do que antes. Perguntem aos que querem viajar em turismo e lazer por Portugal se com os preços dos combustíveis a mais do dobro por litro, onde mais de 60% são impostos, quem mais paga a fatura da imobilidade são ou não as zonas geograficamente mais distantes. Perguntem a qualquer pessoa, mesmo não versada sobre a matéria, se os recorrentes incêndios de Verão são ou não potenciados porque o interior é cada vez mais paisagem e porque quem nos governa se mostra incapaz de concretizar o cadastro dos terrenos rústicos, permitindo que áreas florestais abandonadas e não cuidadas cresçam como erva em prado.
Perguntem ao Governo em funções se já pôs ou pensa pôr em prática medidas corajosas e eficazes para inverter a ideia de que se está a marimbar para a coesão territorial porque não sabe mais, ou porque não tem a honradez e o sentido patriótico de afetar recursos que, embora sendo vitais para o nosso futuro enquanto Nação, não dão os votos suficientes a quem tem vistas curtas e só governa para a eleição seguinte. Perguntem o que mais vos vier à cabeça, sem pessimismo nem otimismo, apenas com o realismo e o pragmatismo de quem tem os olhos abertos e vê muitas nuvens sombrias a pairar sobre o futuro. De perguntas em perguntas, de definhamento em definhamento, de constatação em constatação, cá vamos caminhando e resistindo cada vez com menos respostas, como se amanhã não fosse já tarde demais.
Mas como o interior não pode, nem vai fechar, e como o centralismo do Terreiro do Paço continuará a fazer o seu teimoso percurso, só resta adaptar às nossas circunstâncias a frase de John F. Kennedy: «Não perguntes o que a tua pátria pode fazer por ti, pergunta o que podes tu fazer por ela». Eu farei a minha parte, exortando todos a fazer também a sua para que tudo não fique na mesma.

* Advogado. Ex-deputado do PSD na Assembleia da República eleito pelo círculo da Guarda e antigo presidente da Distrital do PSD da Guarda

Sobre o autor

Carlos Peixoto

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