Na última edição de cada ano pede-se aos colunistas (e aos radialistas, femuristas, e mais gente dedicada a outros ossos do corpo) que façam um balanço do ano – e anos há, que de tanto balançar, chegam a dar vertigens.
2019 não é um número primo, nem sequer um número amigo de infância. Foi um número vizinho, daqueles que bate à porta para pedir açúcar.
Em 2019 houve eleições, indigitações, nomeações, demissões e abandonos. Houve treinadores campeões, outros vice-campeões e alguns despedidos. Houve dois prémios Nobel da Literatura, um muito merecido, o outro também.
No ano de 2019 houve directos, notícias de última hora, e alertas CM. Aconteceram indignações, manifestações, distúrbios e violência – ainda que acções sejam as mesmas, a designação muda conforme a simpatia dos jornalistas com quem as pratica.
2019 viu nascer muitos rapazes que, por virem a ser peças da máquina opressiva do patriarcado, só irão gostar de futebol e matemática. 2019 deu ao mundo quase tantas raparigas que, por crescerem vítimas do violento sistema capitalista, passarão a vida adulta a lavar roupa e a ler Flaubert. (De acordo com um estudo publicado numa revista séria, daquelas que dão pontos na carreira dos professores, se um menino ler – e gostar – de Jane Austen na infância, é muito provável que venha a ser travesti em adulto. E é por isso que nunca leio o “Mansfield Park” antes de terminar a jornada da Premier League).
Num assunto aparentemente não relacionado, a palermice não terminou em 2019 – e nestas páginas de O INTERIOR até voltou com força, com o regresso desta coluna à periodicidade semanal.
Em 2020, os nossos objectivos deveriam ser mais ambiciosos. Por exemplo, publicar uma coluna diária num jornal semanal.
* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia