A quarentena

Escrito por António Ferreira

Sentia-se no ar o desapontamento, pelo menos de alguma comunicação social, por não chegar a Portugal o COVI 19. Era como se até nisso fossemos atrasados. Afinal não somos e já há quem pense que se não deve ir a Lisboa ou ao Porto, onde estão internados os primeiros doentes diagnosticados em Portugal. Nunca se sabe.
É verdade, nunca se sabe. Também se não sabe quantos já foram infetados e continuam por diagnosticar. Afinal, apenas foram testadas algumas dezenas de pessoas. Pode acontecer muitos já terem apanhado a doença e ficado curados, à conta de uma qualquer gripe comum, ou morreram dela, como morrem tantos todos os anos, também da gripe comum.

Pode acontecer também como nos Estados Unidos da América, em que muitos nem se atrevem a entrar no hospital por não terem dinheiro suficiente para receberem tratamento. Seria tudo muito diferente se tivessem um sistema de previdência como em Portugal, mas escolheram Trump, que passou os últimos quatro anos a tentar destruir o pouco que conseguiu Barack Obama. Agora promete a cura para a Primavera, quando o calor acaba por afastar a gripe comum, mas esquece duas coisas: ela regressa no Outono no hemisfério Norte e continua, entretanto, no hemisfério Sul, onde é Inverno. Prometeu, entretanto, uma vacina, mas ela não vai chegar a tempo da sua reeleição, se alguma vez chegar. Por tudo isto dizem muitos que os casos de infeção na América podem ser muito mais do que os diagnosticados.

Há algumas coisas boas em tudo isto, e uma é a consciência geral da importância da higiene. Alguém disse uma vez que o ato médico que salvou mais vidas foi o estabelecimento do hábito dos médicos lavarem as mãos antes de operarem um doente. É também este hábito que pode conter a propagação do vírus, assim como as boas maneiras de quem tosse ou espirra.

Um dos perigos maiores deste tempo é a constatação de que na China se está a conter a propagação do novo coronavírus através da supressão de liberdades individuais, das quarentenas forçadas, da proibição de ajuntamentos, do isolamento de populações. Em Portugal, quando chegou um grupo de portugueses da China, possivelmente infetados, descobriu-se que nada na lei ou na Constituição permitiria obrigá-los a uma quarentena contra a sua vontade. A limitação dos direitos, liberdades e garantias é excecional e esta exceção específica não estava pura e simplesmente prevista. Por isso, a democracia, aqui, aparentemente só estorvou, ou estorvaria, se eles não se submetessem voluntariamente, como fizeram, à quarentena. É claro que isto não é um defeito do sistema, mas sim da lei, e as leis de exceção deveriam prever também esta situação, tal como preveem o recolher obrigatório e muitas outras limitações excecionais em diversas situações excecionais.

Não fazem por isso falta ditadores, não ajuda nada ter, como nos EUA, um idiota à frente do país e tudo se há de resolver, ou remediar, com bom senso, sorte e higiene.

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António Ferreira

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