O Comando Territorial da Guarda da GNR vai comemorar no Sabugal, no próximo dia 1 de dezembro, o Dia da Unidade. O programa que se inicia a 26 de novembro, integrará a exposição “História da GNR”, que vai estar patente na sala de exposições temporárias do Museu do Sabugal desde esse dia até 8 de dezembro, um mês com particular significado para esta força de segurança. De facto, e como já tivemos o ensejo de anotar nesta coluna num anterior apontamento, a chegada dos primeiros elementos da Guarda Republicana à cidade mais alta de Portugal ocorreu em 2 de dezembro de 1914, tendo sido festivamente assinalada pelas entidades locais e população.
O jornal “O Combate” narrou que o dia «estava de rigoroso inverno, caindo uma chuva impertinente», o que não impediu de, à entrada da cidade, afluir «muito povo com a bandeira da Infantaria nº 12, irrompendo em manifestações entusiásticas ao chegar da força», comandada pelo capitão Cesário de Augusto d’Almeida Viana, tendo como «subalterno o sr. Alferes João Afonso de Miranda, 1º sargento sr. João Batista Cardoso de Brito, 7 segundos sargentos, 126 cabos e soldados e 1 corneteiro».
Os elementos desta companhia (4ª de Infantaria), e de acordo com o que divulgou a imprensa citadina, foram depois distribuídos por «Aguiar da Beira 5 praças, Almeida 7, Celorico da Beira 5, Figueira de Castelo Rodrigo 5, Fornos de Algodres 5, Foz Côa 9, Gouveia 9, Guarda 12 de cavalaria e 22 de Infantaria, Manteigas 5, Meda 7, Pinhel 6 de cavalaria e 8 de infantaria, Sabugal 9, Seia 10, Trancoso 7».
Na cidade da Guarda parte dos elementos da força ficaram no edifício da Câmara (onde funciona atualmente a Escola de Santa Clara) e os restantes nas instalações do antigo “colégio jesuítico”, hoje Paço Episcopal da Diocese da Guarda, na Rua do Encontro.
A 31 de outubro de 1914 tinha sido pedida à «Comissão de Execução da Lei de Separação do Estado das Igrejas a cedência da casa onde esteve o colégio das Irmãs Doroteias», na altura desabitada, «para instalar provisoriamente a Guarda Republicana» até que fossem concluídas as obras de adaptação que a autarquia estava a realizar.
Nessa época, a cidade era uma «aldeia grande, com as mil deficiências que caracterizavam os pequenos burgos do interior: seriam pouco mais de seis mil os seus habitantes, acantonados no velho bairro de São Vicente, com a cidade nova a querer romper pelo Campo de S. Francisco, Bonfim e Arrabalde», como escreveu José Maria de Almeida. Descrevendo, depois, o quadro citadino, o articulista refere-se a uma terra quase parada no tempo. «Sem água canalizada, sem esgotos, com os deficientes hotéis de Abel Ferreira de Abreu (Hotel Central) e de José António dos Santos (Hotel Santos), a luz elétrica de fraca potência, escasso policiamento, sem cafés modernos, apenas com a recriação oferecida pelo Teatro dos Bombeiros, pelo Club Egitaniense, frequentado pela alta burguesia, e o Grémio Sande e Castro pelos caixeiros, pequenos comerciantes e funcionários públicos, a Guarda era, tinha de ser mesmo, uma cidade morta, polvilhada de tuberculosos, espalhados pelas casas de doentes, como a da Tamanqueira, da Etelvina ou da Chica, modestas e deficientes pensões, situadas à ilharga da cidade».
A esta realidade acresciam o clima político e social subsequente à implantação da República, numa cidade onde se desenrolaram, ao longo dos anos seguintes vários episódios que testemunharam múltiplos antagonismos.
A vinda da GNR para a Guarda assumiu grande importância. No texto a propósito da chegada desta força de segurança, o jornal “O Combate” acrescentava que «obrigados somos a constatar que a instalação da Guarda Republicana entre nós representa um valioso benefício regional, por ele merecendo os mais calorosos louvores a Comissão Executiva da Câmara e o ex.mo Governador Civil do Distrito, que se esforçaram, com vigor e tenacidade pela sua realização».
O jornal descrevia depois que à estação de caminho-de-ferro da cidade foi, pelas 11h30, «a Comissão Executiva e ali o ilustre Presidente, nosso amigo sr. César Paul, fez ao ex.mo Comandante da Guarda as apresentações, depois de estralejarem no ar inúmeros foguetes». A partir da entrada da cidade, onde como já dissemos estava uma enorme multidão, organizou-se um cortejo que seguiu até aos «Paços da Câmara onde se instalava parte da Guarda Republicana, indo a outra parte para o edifício que foi colégio jesuítico. Pelas 15 horas foi servido jantar aos sargentos e todas as praças, oferecido pela Câmara. O ex.mo Governador Civil ofereceu jantar aos oficiais, tendo como representantes da Câmara o ilustre Presidente da Comissão Executiva sr. César Paul, e o vereador sr. tenente Francisco Esteves da Fonseca».
A partir desta histórica data a Guarda Republicana abriu um novo ciclo no policiamento e segurança do distrito, mais tarde com novos postos e seções. Em 1917 a 4ª Companhia passou a integrar as seções da Guarda, Pinhel e Gouveia; a partir de 1920, e já integrada no Batalhão nº 5, com sede em Coimbra, foram sendo instalados novos postos. Em 1993, com a reorganização implementada no seio da GNR, a 4ª Companhia passou a ser designada por Grupo Territorial da Guarda (passando as secções a Grupos Territoriais). A reestruturação resultante do novo quadro legal definido em 2007 implicou a passagem do Grupo Territorial para Comando Territorial da Guarda, ao qual foram atribuídas novas e acrescidas responsabilidades, reatando, por assim dizer, o papel que teve a 4ª Companhia da GNR.
Ao evocarmos esta efeméride estamos a recordar algumas das páginas da história da Guarda, cidade e corporação, destacando a necessidade de um amplo estudo sobre a génese dos postos que existiram no nosso território, a sua evolução, o papel desempenhado na segurança das populações, a origem e mobilidade dos seus efetivos, os percursos das patrulhas nos mais recônditos lugares, os fardamentos, as condições de trabalho e uma multiplicidade de episódios resultantes da sua atividade operacional.