A propósito de uma Expedição…

Escrito por Hélder Sequeira

“É mais do que tempo da salvaGuarda e valorização destes territórios de história, cultura, lazer e afetos.”

Numa organização conjunta da Câmara Municipal de Seia/ Centro da Interpretação da Serra da Estrela, do História, Territórios, Comunidades – CFE NOVA FCSH e da Sociedade de Geografia de Lisboa foi evocada, na passada semana, a Expedição Científica à Serra da Estrela realizada em agosto de 1881.
A propósito desta iniciativa, foi comentado pela organização que Expedição Científica de 1881 «é o resultado de um esforço coletivo de homens do saber, num território amplamente vasto e desconhecido, todavia, em 15 dias de trabalho árduo, foi possível completar um estudo científico que marcaria a história e a mais completa erudição científico-laboratorial, cartográfica, fotográfica e bibliográfica sobre a serra da Estrela».
O programa do Congresso sobre a Expedição Científica à Serra da Estrela englobou, para além das comunicações apresentadas nos diferentes painéis, uma atividade no Parque da Saúde da Guarda que constituiu um oportuno momento para (re)visitar o antigo Sanatório a que foi atribuído o nome do médico Sousa Martins.
O nome deste clínico está indelevelmente ligado à história da luta contra a tuberculose, em Portugal; de recordar que Sousa Martins, num relatório datado de 1880, fez a caracterização da tuberculose, nessa época, acentuando a importância da criação de sanatórios na zona da Serra da Estrela; em 1881 este integrou a Expedição Científica à Serra da Estrela, promovida pela Sociedade de Geografia de Lisboa Dessa iniciativa resultou a elaboração de relatórios das várias secções científicas, que aparecem compilados num volume intitulado “Expedição Científica à Serra da Estrela” e, dois anos depois, o livro “Quatro Dias na Serra da Estrela”, da autoria de Emídio Navarro.
Essa expedição teve o mérito (e sobretudo através da determinação de Sousa Martins), entre outras relevantes resultados, de chamar a atenção dos meios científicos e clínicos para as condições que a região oferecia no tratamento da tuberculose.
Sousa Martins defendeu a criação de Casas de Saúde nesta zona, impulsionando a fundação, em 1888, do “Club Herminio”, uma associação de carácter humanitário que se manteve durante cerca de quatro anos. Ainda em 1888, e correspondendo aos argumentos de Sousa Martins e de Guilherme Teles de Meneses, o médico Basílio Freire, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, instalou-se na Serra da Estrela, no verão desse ano, onde assegurou consultas gratuitas aos doentes que o procuravam.
Os esforços que Sousa Martins desenvolveu, fortalecidos pelas suas esclarecidas convicções, em muito contribuíram para a construção do Sanatório (inaugurado em 18 de maio de 1907).
O congresso agora realizado, e que justamente assinalou a Expedição Científica de 1881, “permitiu revelar alguns dos segredos da mais alta montanha do território continental, dando a conhecer a Serra nas suas dimensões geográficas, climáticas, orográficas, antropológicas, etnográficas, arqueológicas e médicas”, como foi sublinhado pela organização.
Por outro lado, a atividade (no âmbito desse congresso) que no passado domingo foi desenvolvida no espaço anteriormente do antigo Sanatório da Guarda – onde se encontram os emblemáticos pavilhões num estado de progressiva degradação a caminho da ruína total – foi mais uma chamada de atenção para o valor patrimonial ali existente.
E não falamos apenas dos edifícios da antiga estrutura sanatorial, da sua arquitetura, da sua história, dos materiais utilizados na sua construção, mas também das múltiplas espécies florestais ali existentes, das especificidades geológicas, de aves que ali estão referenciadas (algumas como raras no contexto nacional). Este é um espaço de incentivo ao estudo e à descoberta, num entusiasmante e ímpar contexto interdisciplinar.
Aliás, será com um enquadramento de contributos diversificados que pode ser conseguida uma real salvaguarda e divulgação de uma riqueza patrimonial da Guarda, alheada (apesar de alguns esforços e individuais ao longo de décadas) do potencial de um espaço – voltamos a enfatizar – de reconhecido valor e centralidade.
Um espaço que tem passado à margem de campanhas e debates, porque, lamentavelmente, é mais importante agitar outras bandeiras, em consonância com os interesses de calendários pessoais, políticos ou eleitorais…
É mais do que tempo da salvaGuarda e valorização destes territórios de história, cultura, lazer e afetos. Assim haja vontade e determinação para lançar projetos sólidos, abrangentes e de verdadeiro interesse para a comunidade, sem ostracizar contributos idóneos.

Sobre o autor

Hélder Sequeira

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