O poder político, o poder económico e o poder judicial em Portugal foram nos últimos três anos decepados. O que podemos dizer quando um país tem a pirâmide de suporte de qualquer Estado acusada por corrupção? José Sócrates, antigo primeiro-ministro, na “Operação Marquês”; Ricardo Salgado, tantos anos considerado o “dono disto tudo”, está acusado no contexto do processo sobre o BES; e o ex-juiz Rui Rangel (junto com outros juízes do Tribunal da Relação de Lisboa) está acusado de “vender” acórdãos e colocar a Justiça ao serviço de interesses na “Operação Lex” – juízes de tribunais superiores alegadamente corruptos…
Este enredo, próprio de um filme, surpreende e põe em causa o próprio regime, ainda que o cidadão comum já nem pareça ficar perturbado com a dimensão da corrupção e a falta de vergonha dos protagonistas.
No país do nacional-porreirismo, do amiguismo, do jeitinho, da cunha, do emprego para a família, em que todos se sentam à mesa do Orçamento de Estado para dividir benesses e interesses, já nada surpreende. O regabofe foi normalizado e “meter a mão no saco” do erário público passou a ser um desporto aplaudido em vez de denunciado.
O ex-presidente da Câmara de Castelo Branco fazia negócios com empresas da família, mas Luís Correia não via nisso nada de errado. Nem ele, nem o seu séquito para quem tudo era normal. Felizmente a Justiça funcionou e foi destituído, depois de muitos recursos a sentença cumpriu-se, obviamente! A mulher, Hortense Martins, deputada do PS e até há bem pouco tempo a mais proeminente figura do socialismo albicastrense, falsificou uma assinatura para receber subsídios de 171 mil euros para obras já feitas. Mas inacreditavelmente a procuradora do Ministério Público propôs o arquivamento do processo de falsificação de assinatura em que a deputada era arguida, com o pai, pois o grau de culpa não era «particularmente elevado» – como comentou João Miguel Tavares, uma falta de sentido ético da deputada e da procuradora.
Na última Assembleia Municipal da Guarda o deputado do CDS Henrique Monteiro evidenciou que os terrenos da antiga fábrica Tavares, no Rio Diz, foram adquiridos há vinte anos sem qualquer decisão formal da autarquia, sem deliberação do executivo ou autorização da Assembleia Municipal, sem visto do Tribunal de Contas ou um documento que permitisse legalmente a realização do negócio pela então presidente da Câmara da Guarda Maria do Carmo Borges. Pior, como já sabíamos, a Câmara da Guarda terá pago cerca de dois milhões de euros sem haver escritura do que comprou, ou antes, comprou, e pagou ao longo dos anos, mas só terão sido escriturados alguns artigos – pelo que, parte da propriedade ainda é da família Tavares. Agora o processo está em Tribunal e a Câmara exige a devolução de dois milhões de euros por um bem que pagou ilegalmente. Curiosamente, o advogado da Câmara é Álvaro Guerreiro, que então era vice-presidente da autarquia. Maria do Carmo Borges e Álvaro Guerreiro devem uma explicação à cidade. Como não o fizeram esperemos que se expliquem na Justiça. Até lá, e até porque a cidade não ganhou nada com a negociata feita então à pressa (supostamente porque esses terrenos poderiam ser precisos para a intervenção Polis, mas nunca lá foi feito nada), os protagonistas devem ter a humildade de sentirem vergonha quando saem à rua. Eles e todos os que andam à sua volta e aplaudem estes esquemas, os “boys” e os que se governam com os respetivos “jobs”.