A ditadura dos bancos e dos monopólios numa época de pandemia

Escrito por Honorato Robalo

A pandemia da Covid-19 parece ser o centro das atenções, inclusive dos “fait-divers” da nossa praça entre atores políticos autárquicos, que deixam para segundas núpcias matérias que sempre mereceram uma ampla e profunda convergência quanto ao essencial, nomeadamente entre PS, PSD e CDS em torno do financiamento do poder local, da reposição das freguesias, da discussão em torno do fortalecimento do papel deliberativo dos órgãos autárquicos e, em linha constitucional, a Regionalização.
Parece mais a repetição do corolário da Assembleia da República e foco-me no famoso Programa de Estabilidade de 2020 apresentado pelo Governo que, ao contrário do que aconteceu em anos anteriores, não inclui qualquer cenário macroeconómico para o ano corrente e para o período 2020-2024.
Infelizmente, mais uma vez, a discussão de matérias fundamentais para o nosso dia-a-dia teve apenas a preocupação central do PCP na denúncia do exercício de submissão às regras e imposições da União Europeia (UE), de ingerência e condicionamento das opções macroeconómicas, orçamentais e de soberania nacional.
Seria importante que, no âmbito de um instrumento capitalista e de ingerência na nossa soberania, o Programa de Estabilidade de 2020, o Governo tivesse a ousadia de avançar uma previsão para o crescimento económico em 2020, assumindo uma posição de rutura, mas mantém-se cómodo, já que ao mesmo tempo que não ignora e até divulga as previsões que algumas instituições internacionais (FMI e CE) e nacionais (BdP), não se compromete com nenhuma.
Entretanto, enquanto o Governo não se compromete com nenhuma previsão para a taxa de desemprego, da mesma forma que não arrisca uma evolução do emprego e das remunerações médias dos trabalhadores, vão sendo conhecidos dados oficiais referentes à evolução recente do número de trabalhadores inscritos nos Centros de Emprego, do número de empresas que recorreram ao “lay-off” simplificado, do número de processos de despedimento coletivo iniciados e dos trabalhadores abrangidos por esses processos. Todos estes dados permitem perceber a dimensão das nuvens negras que se abatem já hoje sobre os trabalhadores e as suas famílias, embora o Governo persista em tratar todas as empresas da mesma forma, sejam elas micro, pequenas médias ou grandes.
Neste quadro, os autarcas, independentemente do órgão, deveriam estar unidos na reivindicação ao poder central para cumprir decisões de investimento no interior do país. Perante a importância da agricultura e também da natureza do tecido económico da nossa região, nomeadamente da revitalização de áreas fundamentais da indústria têxtil, todos devemos perceber e agir no caminho da nossa soberania alimentar e industrial. A pandemia veio exacerbar o controlo político por parte dos agiotas financeiros e multinacionais que controlam diversos países pela via da aquisição de empresas estratégicas nacionais, desde a energia, cimento, comunicações, entre outras. Nada é ao acaso pois os grandes países da UE tentaram impor e conseguiram aniquilar a soberania de muitos países, incluindo o nosso. É urgente que haja outro caminho que fomente a nossa autonomia e soberania, sem descurar as relações internacionais, assentes em pressupostos de solidariedade e respeito pela independência dos Estados. O poder político deve submeter o poder económico para que esteja ao serviço dos povos e não dos monopólios capitalistas.
Com este Programa de Estabilidade, o Governo não faz mais do que meter a cabeça na areia para não querer ver o que se está a passar no mundo das empresas e no mercado de trabalho.
No fim, passado o surto epidémico, não vamos ficar todos bem. As enormes desigualdades, bem patentes ainda hoje na nossa sociedade, ter-se-ão acentuado. A precariedade e o desemprego terão crescido ainda mais e o nosso tecido produtivo, já hoje muito fragmentado e fragilizado, ainda será mais destruído.
A necessária política de soberania patriótica e de esquerda implica o envolvimento de mais democratas e patriotas que acreditam nos alicerces de Abril, estes têm que ser acautelados e reforçados para o bem coletivo. Além do SNS, há outras áreas fundamentais, bem como serviços públicos de acesso universal e ao serviço das populações e não engordando os mesmos de sempre.
O nosso poder local também é um esteio fundamental e proximidade ao serviço das populações e que não se compadece com zangas de comadres. Aos eleitos cabe a nobre função de servir.

* Militante do PCP

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Honorato Robalo

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