A confirmação de que Coimbra irá receber a coleção de 196 obras que foram do BPN, e o Estado adquiriu, é uma extraordinária notícia para aquela cidade, mas também para toda a região Centro. Para acolher esse excecional acervo, Coimbra irá criar, com o apoio do Governo, um novo centro de arte contemporânea no antigo edifício da Manutenção Militar (provisoriamente a coleção irá ficar instalada num edifício junto ao Arco de Almedina).
Poder ver fora de Lisboa obras de mais de 80 artistas nacionais de referência, como Maria Helena Vieira da Silva, Joaquim Rodrigo, Paula Rego, Helena Almeida, Jorge Martins, Nikias Skapinakis, Júlio Pomar, Julião Sarmento, Fernando Calhau, Cruzeiro Seixas, Álvaro Lapa, José Pedro Croft, João Pedro Vale e Vasco Araújo ou um pequeno retrato do modernista Amadeo de Souza-Cardoso, além dos 31 estrangeiros mundialmente reconhecidos como Antoni Tàpies ou Sonia Delaunay na região Centro é uma mutação extraordinária. Poder apreciar “Voyage d’Hiver”nas Beiras é uma mudança de paradigma até agora impensável.
Há muito Portugal para além de Lisboa (o Porto já tinha recebido o acervo da Miró). Há todo um país para cumprir. E é através de mudanças como esta que se pode caminhar rumo à coesão territorial sempre adiada.
A cultura é a base da transformação da sociedade, como diria Sophia, e é a alavanca que pode construir uma nova sociedade, mais justa e equilibrada, e um país menos assimétrico. É essa alavanca que pode contribuir decisivamente para o desenvolvimento do país, para além de Lisboa (o PIB per capita da área metropolitana de Lisboa é de 106% da média Europeia a 28, enquanto o Centro tem 68% e o Norte 65%).
Esta decisão é um pequeno passo na descentralização e na desconcentração de serviços públicos e de investimento público. É nesse sentido que os deputados eleitos pelos distritos do interior do país se devem manifestar: muito mais importante que a disciplina de voto dos partidos é a defesa intransigente do país como um todo, e muitas vezes para defender o todo é preciso primeiro reivindicar o interesse das partes.
Como é evidente, o investimento num novo centro de arte contemporânea em Coimbra é mais um argumento pela candidatura daquela cidade a Capital Europeia da Cultura. Numa altura em que a candidatura da Guarda muda de rumo e parece ter um novo élan, o fortalecimento de outras candidaturas terá de exigir mais ambição e ideias à candidatura guardense.
Não bastará apresentar rostos e nomes, ou sequer o compromisso de 17 municípios, para dar sustentabilidade ao projeto. A dois anos da escolha da Capital Europeia da Cultura de 2027, a Guarda está lançada numa corrida concorrida, mas sem o envolvimento da comunidade (se não fosse a imprensa falar do assunto as pessoas não sentiriam a notoriedade da candidatura, pois não há atividades, nem
promoção pública, que permitam o envolvimento dos cidadãos).
E enquanto outros conseguem novos argumentos de peso, e relevantes para o país, a candidatura da Guarda está distante da sociedade e das associações culturais e ainda não apresentou o programa e argumentos que convençam a comunidade, quanto mais o restrito e exigente júri que irá nomear a Cidade Capital da Cultura.