De nada adianta fazermos os pedidos de ano novo aquando cada passa metida na boca se não olharmos para nós próprios convictos de que somos bons, vamos fazer melhor e acima de tudo vamos conseguir. A segurança pode ser a chave do sucesso de quem acredita que conseguir alcançar os seus objetivos depende de uma vontade sua, dos seus passos, ou seja de uma vontade individual.
No entanto, nem tudo o que nos rodeia depende de uma decisão personalizada. Elegemos quem decida por nós, quem nos defenda, quem recorde o que precisamos e o que queremos, numa espécie de vontade coletiva, com o objetivo de melhorar dia após dia, a qualidade de vida. E estará essa qualidade de vida assegurada no nosso distrito? Temos efetivamente qualidade de vida? Numa visão mais romântica, a qual também partilho, viver aqui é bom, esta calma, este sossego (na maioria das vezes). Contudo, vamos por partes e fazendo uma retrospetiva… Nem tudo é um mar de rosas. Começamos pela introdução de portagens na A25 e A23. Quem conhece bem a A25, sabe que não estamos a falar de uma autoestrada de vanguarda. Não estamos perante nenhuma obra de tal forma inovadora tendo em conta o cariz montanhoso de alguns dos seus km. Mas pagamos por ela. Aliás, passámos a pagar para circular nela, quando ao mesmo tempo ouvimos, talvez também há uma década com mais incisão, a necessidade de medidas discriminatórias para o interior de forma a evitar ficarmos às moscas. D. Manuel Felício, o Bispo da Diocese da Guarda, diz que receia o que vão mostrar os próximos Censos 2021. Da minha parte, mais do que um receio, é a constatação, enquanto jornalista que percorre povoações quase sem gente.
Vamos pensar em grande para 2020? Ou sonhar, vá. Primeiro, já que estão a mexer no IP3, não o remendem com uma espécie de estrada com perfil de autoestrada. Façam-na ser uma autoestrada que ligue Viseu a Coimbra de uma forma condigna, já que muitos dos serviços de saúde públicos nos reencaminham para tratamentos onde? Em Coimbra. Segundo sonho… Porque não dignificar a região Centro com um aeroporto em vez de construir mais um na zona Sul? Terceiro sonho, porque não a rede ferroviária passar em toda a região interior sem deixar Bragança de fora e já agora deixar o Alfa vir espreitar aqui à Guarda? Quarto sonho: um centro oncológico na Guarda com tratamentos de quimioterapia e radioterapia, ou será como Viseu, em que um privado já inaugurou uma unidade e o hospital público continua à espera do cumprimento das promessas?
Poderiam ser tantos os sonhos, mas não quero ser pessimista, alguns deles já vão ser concretizados em 2020. O salário mínimo aumenta e bem, digo eu, que sou trabalhadora. Para algum patronato, esta subida vai criar sérios constrangimentos. Mas a verdade é só esta: como sobrevive uma mãe solteira que receba o salário mínimo e que tenha à sua responsabilidade dois filhos? Sabem onde encontrei essa mãe? Na Cáritas.
Quer isto dizer que, apesar da esperançada descentralização de algumas pastas governamentais para as regiões mais interiores como Guarda ou Bragança, esta descentralização pode não significar a viragem de que precisamos. Não nos deem mais amendoins, queremos pinhões.
* Jornalista, correspondente da Renascença e diretora do “Notícias de Gouveia”