Cara a Cara

«Se não forem os trabalhadores a darem-lhes força, os sindicalistas não conseguem fazer nada sozinhos»

Escrito por Jornal O INTERIOR

Entrevista a Sérgio Santos, Coordenador da União de Sindicatos de Castelo Branco

P – É o novo coordenador da União de Sindicatos de Castelo Branco. Porque decidiu assumir este cargo?
R – Fui eleito a 22 de outubro por unanimidade na direção da União e desde logo aceitei a indicação porque sou uma pessoa dedicada às causas, estou sempre pronto para a luta e não lhe viro as costas. Os sindicatos sabem que podem contar comigo e eu também sei que posso contar com eles e vou tentar dar de mim o melhor que sei e posso.

P – Quais são os maiores problemas que os trabalhadores do distrito enfrentam nesta conjuntura de pandemia?
R – Os trabalhadores do distrito são maioritariamente trabalhadores do salário mínimo, então em “lay-off” perderam uma parte do seu já pequeno salário. Falo de trabalhadores do turno geral, mas se for para trabalhadores do segundo ou terceiro turno as perdas são muito maiores – imagine um trabalhador que trabalhe nos lanifícios, esteja no terceiro turno e a perda chega a ser de cerca de 300 euros. Ora isso para uma família é insuportável, ainda para mais com a subida dos passes sociais de 18 para 39 euros… As perdas são muito grandes e numa altura como esta, em que as famílias deviam ser ajudadas, ainda pioram a sua situação.

P – Concorda que a Covid-19 tornou o trabalho ainda mais precário e cada vez mais incerto?
R – No início da pandemia o Governo disse que para as empresas terem o incentivo não podiam despedir ninguém, esqueceram-se foi de proteger os trabalhadores que tinham vínculos precários. Resultado: chegaram ao fim do contrato e foram despedidos quando, em situação normal, os contratos seriam renovados ou os trabalhadores passariam aos quadros das empresas. Houve muitas empresas que despediram no distrito de Castelo Branco, grandes grupos lançaram no desemprego centenas de pessoas, na sua maioria jovens, mas também alguns menos jovens que, neste momento, têm o seu futuro incerto, pois para as empresas são velhos para trabalhar, mas são novos para entrarem na reforma. Por isso, além de uma pandemia em termos da saúde, agora temos a pandemia social.

P – Quantos trabalhadores sindicalizados há no distrito de Castelo Branco?
R – A sindicalização é da responsabilidade de cada sindicato e só eles têm esses dados, mas posso afirmar que temos uma sindicalização superior à média nacional dado haver setores industriais, como os lanifícios, onde a sindicalização é tradicionalmente elevada. Estamos a sindicalizar muito bem na administração pública e nos sectores emergentes, como o dos polimentos e relojoaria e do papel. É claro que acho que toda a gente deveria ser sindicalizada, pois é nos sindicatos que está a base de defesa e garantia dos seus direitos.

P – Acha que as pessoas deviam manifestar-se mais pelos seus direitos? Ou há comodismo, desinteresse ou resignação?
R – Claro que os trabalhadores deviam manifestar-se mais. Dou-lhe um exemplo. A contratação coletiva nos lanifícios e nas confeções está parada. Antes da pandemia chegar a Portugal, tanto a ANIL/ ANITLAR pelos lanifícios, como a ANIVEC pelo vestuário, cancelaram as negociações com a desculpa da pandemia. Mais tarde foram feitos contactos para se retomarem as negociações e estas estruturas voltaram a dizer que não havia condições. Ora o que está em causa, como já disse, é que o distrito é caracterizado por baixos salários e os trabalhadores dos têxteis auferem o salário mínimo. Se em 2020 o salário mínimo nacional subiu para 635 euros, todos os trabalhadores da letra I até à F foram absorvidos pelo salário mínimo, ou seja, não houve diferenciação de letras e os das restantes letras não tiveram qualquer aumento, mas com o aproximar do 2021 e com o Orçamento de Estado em discussão vamos ter aí novo aumento do salário mínimo. O que vai acontecer? Provavelmente mais letras vão ser absorvidas pelo salário mínimo nacional e os trabalhadores, quando são chamados a lutar pelo seu rendimento e direitos, nem sempre respondem à altura das necessidades, dizem que os sindicatos é que têm que lutar por eles, que é para isso que pagam cotas. Mas se não forem os trabalhadores a darem força ao seu sindicato, os sindicalistas sozinhos não conseguem fazer nada, por isso peço aos trabalhadores, do privado e do público, que apoiem mais quem os apoia, pois só assim conseguem o que antes não conseguiam, e conseguem chegar onde antes não conseguiam.

P – Hoje em dia os trabalhadores têm mais ou menos direitos do que há 20 anos?
R – Claro que têm mais direitos, foram muitos os ganhos por causa das muitas lutas que se foram travando ao logo destas duas décadas, mas ainda há tanto por melhorar e tanto para lutar porque a ofensiva patronal não para, assim como a luta não pode nem deve parar.

 

Perfil de Sérgio Santos

Coordenador da União de Sindicatos de Castelo Branco

Profissão: Operário têxtil

Idade: 41 anos

Naturalidade: Covilhã

Currículo: Em 2015 integrou a direção do Sindicato Têxtil da Beira Baixa (STBB); em 2017 pertenceu à direção nacional da FESETE e no ano seguinte foi vice-presidente do STBB e membro da direção da União de Sindicatos de Castelo Branco, tendo sido eleito coordenador da USCB este ano; Integra ainda o Conselho Nacional da CGTP

Livro preferido: “O Nome da Rosa”, de Umberto Eco

Filme preferido: “O dia depois de amanhã”, de Roland Emmerich

Hobbies: Caminhadas, fotografia, bricolage, etc

Sobre o autor

Jornal O INTERIOR

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