P – O Clube Vertical existe há mais de três décadas e é das maiores associações de parapente no país. Como se mantém esta longevidade e sucesso numa modalidade que não é tão explorada em Portugal?
R – Sim, o clube foi fundado em 1991, em Coimbra, mas o sócio fundador sempre teve ligações à Serra da Estrela e família no Sabugal e, em colaboração com outros pilotos da Guarda, acabaram por identificar Linhares da Beira como, talvez, o local mais saudável para voos. Há dois períodos importantes na nossa história que nos fizeram evoluir. Um foi a criação de uma das primeiras escolas de parapente no país, em Linhares da Beira, com a cooperação da Fundação Inatel. Outro foi a exploração de novos locais de voo no vale do Zêzere, como no concelho de Manteigas, onde temos atualmente a nossa sede. Além disto, o clube tem o privilégio de voar em toda a Serra da Estrela e somos os únicos a fazê-lo estes anos todos. Temos ainda a vantagem de estar no melhor local de voo do país, que atrai pilotos de várias regiões, e isso também ajuda a dinamizar a nossa atividade.
P – Organizam vários eventos ao longo do ano, como o “Linhares a Voar” este fim de semana. Quanto custa organizar uma atividade deste tipo e quantos participantes costumam receber?
R – Organizamos dois tipos de eventos. No “Linhares a Voar”, gastamos entre mil a dois mil euros, mas para uma competição já despendemos entre 10 a 20 mil euros. O “Linhares a Voar” é um tipo de eventos que realizamos a um custo relativamente reduzido, que é aberto toda a população e onde temos batismos de voo, atividades de aprendizagem e também de lazer para pilotos profissionais. Estas atividades mais pequenas ocorrem umas quatro vezes ao ano, entre Manteigas e Linhares, e costumamos ter muita recetividade, tendo tido no ano passado cerca de uma centena de participantes. Os eventos pequenos são financiados mais através dos participantes, pois cobramos uma pequena taxa e conseguimos cobrir os custos, apesar de não termos lucros. Porém, temos também eventos maiores que necessitam do apoio das autarquias, pois são competições com outro tipo de logística associada porque saímos da região e aterramos noutros locais longe da Serra da Estrela, como em Espanha, pelo que precisamos de maior ajuda financeira e apoio.
P – Como mencionou, o clube também fundou uma escola de parapente em Linhares da Beira. Quantos alunos têm por ano e quais são as idades mais predominantes?
R – A escola está a funcionar praticamente ininterruptamente, com várias configurações, e um dos sócios fundadores do clube ainda é hoje instrutor e formou não só vários pilotos, como também vários instrutores, portanto, temos tido algum sucesso nisso. Temos em média cerca de 10 alunos por ano só na iniciação e depois há outros níveis de formação, uma inicial e uma avançada para pilotos já formados que têm outro tipo de licenciamento e então, entre os vários patamares, conseguimos ter ainda mais alunos no total. É gente de todo o país e, por incrível que possa parecer, a maior parte até é de fora da região. Gostávamos de atrair mais alunos de cá e temos feito um esforço para tentar dinamizar a modalidade nas escolas. Estamos a planear um projeto de desporto escolar em parceria com as Câmaras de Celorico, Manteigas e Covilhã, que espero poder anunciar em breve. O objetivo é incluirmos o parapente no desporto escolar porque só podemos começar a formar pilotos a partir dos 16 anos e gostávamos de criar o “bichinho” nos mais jovens. Em termos de idades, temos pessoas desde os 16 anos até acima dos 70, mas não acho que haja uma limitação de idades e nós ajustamos a atividade com a capacidade das pessoas envolvidas. No último festival de Linhares tivemos uma senhora com 82 anos a fazer um voo connosco, por exemplo.
P – Linhares da Beira é considerada a “catedral” do parapente em Portugal. Acha que o trabalho e as atividades do clube na zona contribuíram para este reconhecimento internacional?
R – Gostava de dizer que sim e acho que é verdade, diria até que o clube tem algum orgulho nisso. Se falarmos no meio do voo livre, seja parapente, asa-delta ou outro, nacional como internacional, acho que associam bastante o Clube Vertical a Linhares da Beira e à Serra da Estrela e temos obviamente orgulho nisso. Mas há vários fatores que contribuíram para este reconhecimento, como ter havido na década de 90 o primeiro recorde europeu que foi batido em distância livre a mais de 200 quilómetros, de Linhares da Beira para Zamora, e que colocou esta aldeia no mapa internacional. Linhares da Beira foi desde muito cedo identificada como a “catedral” do parapente em Portugal por uma razão fundamental, que é a geografia do local. Tem ótimas condições para um voo de permanência e, sobretudo, para atividades de escola e aprendizagem.
P – Na sua perspetiva, como está a modalidade na região e como está Portugal em termos competitivos?
R – Gostávamos de atrair mais alunos da região e temos feito um esforço para tentar dinamizar nas escolas, como vai ser o caso com o projeto de desporto escolar de que já falei. A nível nacional, Portugal tem tido um número relativamente estável de praticantes e o crescimento é residual, além disso tem havido também um esforço da Federação para promover estas atividades e daí a questão de promover este tipo de atividades com os mais novos. Do ponto de vista competitivo, acho que Portugal tem um conjunto de pilotos bastante competitivos a nível internacional e aí sim tem havido crescimento de uma forma bastante saudável e resultados bastante interessantes. Como local de voo, a Serra da Estrela é privilegiada, sobretudo a nível europeu, e conseguimos atrair competições de países nórdicos, que organizam provas internacionais fora dos seus países porque não têm as melhores condições de voos. Isto para não falar de campeonatos europeus ou taças do mundo, portanto, acho que não só Linhares, como a Serra da Estrela como um todo, criam as condições de voo ideais para a modalidade.
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BRUNO CARVALHO
Idade: 45 anos
Naturalidade: Cascais
Profissão: Gestor de empresas no setor espacial
Currículo (resumido): Formação em engenharia eletrotécnica e de computadores no Instituto Superior Técnico; Presidente da direção do Clube de Voo Vertical
Livro preferido: “The Moon is a Harsh Mistress”, de Robert A. Heinlein
Filme preferido: “Blade Runner”, de Ridley Scott
Hobbies: Parapente