Cara a Cara

«É necessária uma maior descentralização dos fundos financeiros e a mudança do paradigma na distribuição de verbas»

Escrito por Jornal O INTERIOR

Entrevista a Carlos Ascensão, Presidente do Conselho de Administração da Associação de Desenvolvimento Rural da Serra da Estrela (ADRUSE)

P – Foi eleito presidente do Conselho de Administração da ADRUSE, quais são as suas prioridades para o mandato?
R – São dar continuidade ao trabalho, já encetado pelo anterior presidente, Manuel Fonseca, no sentido de equilibrar financeiramente a instituição, e proceder a uma reorganização interna no âmbito dos recursos humanos. Tencionamos também procurar implementar novos projetos de investimento, na perspetiva das possibilidades que poderão advir do novo quadro comunitário, além de procurar criar articulações e dinâmicas novas com outros parceiros, intra e extra território da Serra da Estrela, nomeadamente com a Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela (CIMBSE).

P – Como está a Associação de Desenvolvimento Rural da Serra da Estrela, em termos financeiros e de projetos?
R – Por razões diversas, desde há uns anos a esta parte que a ADRUSE se encontra com um desequilíbrio financeiro. Uma das razões foi a perda de recursos e de oportunidades de intervenção em diversos âmbitos, por força da entrada de outras instituições que vieram ocupar um espaço privilegiado de ação e uma centralidade local anteriormente inexistente. Estou a referir-me, concretamente, ao aparecimento das Comunidades Intermunicipais. A carteira de projetos diminuiu drasticamente, enquanto o quadro de pessoal ficou, a partir de um certo momento, em excesso.

P – O que ficou por fazer nestes últimos anos?
R – Muito tem sido feito nestes já largos anos de vida da ADRUSE. Todavia, temos a plena consciência de que ainda há muito por e para fazer nestes nossos territórios rurais fustigados por uma agricultura decadente e de quase subsistência, aliados a um envelhecimento acelerado da nossa população e a uma diminuição drástica da mesma. Não tenho dúvidas que o nosso drama maior é de cariz demográfico. É imperioso revitalizar as nossas aldeias, criar novas dinâmicas locais, visando os que cá habitam, atraindo mais visitantes e novos povoadores. Internamente, há uma reorganização estrutural que urge concluir.

P – Por culpa de quem, dos parceiros locais ou do Governo?
R – As culpas, como os méritos, raramente têm exclusividade. Eu diria que há uma culpa maior dos nossos decisores políticos de Lisboa, que, ao longo do tempo, foram retirando espaço de ação e consequentes apoios, também financeiros, a estas estruturas de intervenção local, priorizando, erradamente, outros agentes. Naturalmente, haverá também responsabilidades dos diversos atores locais, públicos ou privados, que nem sempre terão sabido tirar partido e ter o envolvimento necessário e adequado face aos desafios que os contextos e as oportunidades, porventura, exigiam.

P – Quais são os setores de atividade que predominam em termos de projetos apoiados?
R – As principais áreas de intervenção, no contexto da nossa ruralidade e do nosso património natural e histórico-cultural, situam-se, primordialmente, nos domínios da agricultura e do turismo, tendo como referencial maior as pessoas, as nossas gentes. Também a revitalização urbanística, aliada à nossa cultura e tradições, são eixos de intervenção prioritários, bem como tudo o que concerne à nossa economia social, hoje predominante.

P – O que pode mudar com o próximo quadro comunitário?
R – Temos expectativas, e o desejo, de que haja uma atenção e um investimento substancialmente crescente neste tipo de estruturas locais, tão importantes, pela proximidade e conhecimento do meio, para salvar este território há muito agonizante. Para isso é necessário que haja uma maior descentralização dos fundos financeiros e a consequente mudança do paradigma no que concerne ao investimento e distribuição de verbas. O que reivindicamos na Europa ao nível da coesão social deve servir também cá dentro e tenha aplicação ao nível do território nacional. Promova-se uma desigualdade justa e ajude-se mais quem, historicamente, menos tem sido ajudado e mais carências tem. Está na hora de passar de uma retórica inconsequente, já desacreditada, de que é preciso promover uma discriminação positiva nestes nossos territórios de baixa densidade, a uma praxis política de verdade.

 

CARLOS ASCENSÃO

Presidente do Conselho de Administração da Associação de Desenvolvimento Rural da Serra da Estrela (ADRUSE)

Idade: 58 anos

Naturalidade: Rapa, atual União de Freguesias Rapa e Cadafaz (Celorico da Beira)

Profissão: Professor

Currículo: Licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra; professor efetivo na Escola EB2,3/S Sacadura Cabral, lecionando as disciplinas de Filosofia/ Psicologia. Entre outras, lecionou na Escola da Sé e Escola Secundária Afonso de Albuquerque, na Guarda, e na Escola Profissional Trancoso. Esteve ligado ao futebol durante algumas dezenas de anos, como atleta e treinador (SC Celoricense, CCDR Lageosa do Mondego, GDR Vale de Azares, GD Trancoso, CCDR Vila Cortez do Mondego e GD Vila Franca das Naves). É presidente da Câmara Municipal de Celorico da Beira

Livro preferido: “Confesso Que Vivi”, de Pablo Neruda

Filme preferido: “A Vida É Bela”, de Roberto Benigni

Hobbies: Jogar futebol, desportos de Natureza (caminhadas), ler, jardinagem, agricultura

Sobre o autor

Jornal O INTERIOR

Leave a Reply