P – Qual é o espírito e o objetivo da Orquestra Sem Fronteiras?
R – A Orquestra Sem Fronteiras (OSF) é um projeto de coesão territorial e social através da música clássica. A sua ação divide-se em dois eixos principais. O primeiro é o apoio aos jovens que prov
êm das instituições de ensino do interior e a quem são oferecidas bolsas para incentivar o seu mérito académico e a transição para o mundo profissional. O segundo é a contribuição para a oferta cultural no interior, incluindo atividades de descentralização radical, com amplo alcance territorial, oferecendo programação orquestral em aldeias, com um programa crescente de formação de públicos. O lado espanhol estará sempre mais presente neste projeto, que pretende também congregar jovens dos dois lados da fronteira. Depois do Verão teremos importantes novidades a apresentar em Espanha.
P – Está sediada em Idanha-a-Nova, o que prevaleceu na escolha?
R – Idanha-a-Nova é o lugar ideal para nós pela importância que a música ocupa no território (reconhecido com o selo UNESCO para a criatividade musical), por ser um lugar que fica no centro do eixo geográfico e, portanto, conveniente para concentrar jovens provenientes de muitos locais. E porque foi aí que sentimos uma verdadeira aposta em nós e vontade de trabalhar juntos. Tenho a certeza que é o lugar certo para termos a nossa casa, mas somos uma organização que passa muito tempo fora de casa.
P – É um projeto com jovens músicos. Foi fácil formar esta orquestra?
R – Foi fácil na medida em que os ingredientes principais existem e estão todos disponíveis: o talento dos jovens, que é abundante e urge apoiar o máximo possível, e os espaços para nos apresentarmos. São os teatros e auditórios com excelentes qualidades que temos pelo país, tal como uma grande quantidade de igrejas e lugares históricos onde é bem-vinda a dinamização desse património secular.
P – Quais são as principais dificuldades deste projeto?
R – São sobretudo de nível logístico, uma vez que o nosso compromisso é garantir que os jovens nunca terão de despender um cêntimo para participar na nossa programação, o que significa que, além da atribuição da bolsa, oferecemos alojamento, refeições e transportes quando necessário. Em cada concerto temos de combinar as variáveis dos músicos que vêm de diferentes locais, e procuramos sempre a ajuda das Câmaras Municipais. Esta fase é um pouco um quebra-cabeças logístico.
P – Já atuou em Badajoz, no Sabugal, Penamacor e Covilhã, entre outras localidades, quais são os concertos em agenda?
R – Desde a sua criação, em março, até ao final de junho, a OSF apresenta-se em 22 localidades raianas, nos concelhos de Idanha-a-Nova, Penamacor, Belmonte, Guarda, Sabugal, Covilhã, Campo Maior e Badajoz. Depois do Verão teremos mais concertos e novos projetos, sobretudo na área da oferta pedagógica.
P – O facto de ter ligações familiares a Aldeia Velha (Sabugal) foi um elo determinante para vir para o interior do país. Qual tem sido a sua relação com a região?
R – Mesmo que não tivesse essa ligação sentiria que é importante que todos os músicos contribuam para a valorização do país em todas as suas capacidades. Antes de ser músico sou cidadão português, e para mim é importante poder dar o máximo contributo possível com a minha arte. De resto, sempre fui um visitante assíduo do interior, sobretudo do Alentejo, e há muito tempo que tinha vontade de por em marcha um projeto assim. Foi por isso que esta foi a primeira coisa a que me dediquei quando regressei a Portugal, depois de um hiato de seis anos a estudar e viver no estrangeiro.
P – Como vai ser o espetáculo que vai dirigir no dia 11, no âmbito do SIAC?
R – Este evento, a que chamámos “Escutar o Silêncio”, é um dos programas mais interessantes que tenho ao longo de todo o ano, por combinar três vertentes que considero fundamentais: teremos o concerto, mas antes disso haverá masterclasses e uma palestra que inclui a projeção de um filme! Por um lado, os nossos artistas irão transmitir conhecimentos aos alunos do Conservatório da Guarda e outros músicos que queiram participar. Eu darei uma palestra para o público em geral, de forma a oferecer pistas e enriquecer a escuta deste repertório interessantíssimo. E no fim tudo converge num concerto com obras extraordinárias escritas na segunda metade do séc. XX e já no séc. XXI. Espero que o público da Guarda compareça em número generoso, pois é um programa com qualidade para estar em qualquer lugar do mundo, e é com enorme orgulho que o oferecemos à Guarda, para onde foi concebido. Um programa desta natureza representa o modelo ideal de contributo enquanto artista, pois lança raízes na sociedade, promove a reflexão e é um ponto de encontro com a beleza e o pensamento. Só desta forma é que a arte poderá ser um elemento construtivo de uma cidadania plena.
Perfil de Martim Sousa Tavares:
Maestro da Orquestra Sem Fronteiras
Naturalidade: Lisboa
Idade: 27 anos
Profissão: Maestro, comunicador e autor
Currículo: Licenciaturas em Ciências Musicais na Universidade Nova de Lisboa e Direção de Orquestra na Italian Conducting Academy e Conservatorio di Musica di Brescia; Mestrado em Direção de Orquestra na Bienen School of Music, obtido com a mais alta classificação e menção honrosa, enquanto bolseiro da Fulbright e Eckstein Foundation; Dirigiu orquestras de sete países, realizou mais de uma dezena de estreias mundiais e também primeiras audições modernas; Fundou em 2014 a Orchestra di Maggio e em 2019 a Orquestra Sem Fronteiras. Como comunicador tem sido ouvido em instituições como o Buffet Institute for Global Affairs, Nova SBE, Universidade de Coimbra, TedX, Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian e outras.
Livro preferido: “O Retrato de Dorian Gray”, de Oscar Wilde
Filme preferido: “Barry Lyndon”, de Stanley Kubrick
Hobbies: Nadar e cozinhar para amigos.