Cara a Cara

«Conciliar treino, estudos e combates é a maior dificuldade»

Pedro Obara 2
Escrito por Efigénia Marques

P – O que leva um jovem a praticar boxe de forma competitiva? Como surgiu este desporto na sua vida?
R – A prática desportiva sempre foi algo que os meus pais incentivaram, era quase uma obrigação ter uma atividade física, o que era um pesadelo para a minha irmã. Onde morávamos, na vila do Ferro, havia apenas aulas de karaté, que pratiquei por pouco mais de um ano. Depois mudámo-nos para a Covilhã e, por acaso, os meus pais encontraram uma secção de boxe. Fiz uma aula experimental e fiquei surpreendido com a modalidade, era bem mais interessante e complexa do que pensava, para desespero da minha mãe, que até hoje não assistiu a nenhum combate meu. As competições surgem naturalmente, faz parte da aprendizagem de qualquer desporto, é uma espécie de intercâmbio, de troca de experiências, de técnicas, com atletas do mundo inteiro. Já competi com italianos, irlandeses, espanhóis e portugueses de diversos lugares. A competição é um momento único de aprendizagem e, ao mesmo tempo, de perceber como estou como atleta. Quando perco, o meu treinador consegue avaliar onde preciso melhorar. Quando ganho, ele também encontra os defeitos para que eu possa melhorar. Ele fica feliz, mas puxa o treino seguinte com foco nos meus pontos fracos.

P – O que representa este título para a sua carreira?
R – O título é uma alegria e uma recompensa imensa. Os treinos, com as aulas, é algo muito cansativo e acabo por abdicar de muitas coisas. Não se pode comer qualquer coisa, não posso ir para festinhas, a namorada fica em segundo plano, aliás, ficava, ela terminou comigo. Então o título é a recompensa por tudo aquilo que tenho de abdicar. É também um agradecimento para o meu treinador, que dedicou tanto tempo e energia para me ensinar e o meu maior obrigado é levar o título para a nossa equipa.

P – Quais as dificuldades que tem sentido para praticar e competir? Que
apoios tem?
R – Apoio por enquanto apenas do meu pai e da minha mãe, que procuram fazer o melhor dentro das suas possibilidades, tentando ajudar-me da melhor forma possível. As dificuldades são muitas, na maior parte dos dias de treino, por falta de transporte, vou de bicicleta, sete quilómetros para ir e outros sete para voltar. A alimentação é sempre complicada, como não tenho um nutricionista, preciso pesquisar na Internet o que comer, como comer, quando comer. Ainda não tenho um acompanhamento especializado. Falta um profissional que também me oriente na parte muscular e aeróbica. Não tenho uma infraestrutura geral para que eu possa desenvolver-me mais e melhor. Até as luvas do treino estão meio más depois do meu cachorro ter decidido brincar com elas.

P – Como concilia os estudos, os treinos e os combates?
R – Conciliar treino, estudos e combates é a maior dificuldade, tanto de tempo quanto de energia para focar em tudo ao mesmo tempo. Procuro manter os estudos de uma forma constante, não deixo acumular matérias para estudar. Os treinos são à noite, então acabo por dormir tarde e ter que acordar cedo no dia seguinte, o que é bem complicado e cansativo. Nas semanas que antecedem os combates, o treinador faz um treino mais intenso e específico, estuda os oponentes, transmite-me o que preciso melhorar. Ter que estar dentro do peso de 63 quilos também é algo que requer sempre bastante cuidado. Nos dias de combate, que nunca são na Covilhã, saímos na véspera e muitas vezes no próprio dia, o que acaba por ser uma desvantagem para os atletas do interior. A maioria dos torneios é em Lisboa, Porto ou Algarve.

P – Tem o objetivo de representar Portugal nos Jogos Olímpicos de 2028?
É um sonho alcançável?
R – Com toda a certeza, competir nos Jogos Olímpicos é o sonho de qualquer atleta, imagina não apenas a sua equipa, a sua família torcendo por você, mas um país inteiro. Acho que em Portugal ainda temos pouco apoio e incentivo em diversos desportos, no boxe então parece tudo ainda mais complicado. O meu pai diz que a diferença de sonho e objetivo é algo simples: o sonho é deitar na cama e sonhar com algo, o objetivo é algo que você traça e busca desenvolver os meios para chegar lá. Se alcançarei esse objetivo? Se depender da minha vontade, sim, com certeza! Guardem esta entrevista, daqui a uns anos talvez me reconheçam no pódio.

____________________________________________________________________

PEDRO HENRIQUE OBARA

Vencedor da Taça de Portugal de boxe em cadetes 63 quilos

Idade: 16 anos

Profissão: Estudante

Currículo (resumido): Estudante da Escola Secundária Quinta das Palmeiras, na Covilhã; Iniciou treinos de boxe com o professor Amílcar Pinto em 2021; Integra a equipa de boxe do Oriental de São Martinho desde 2023, sob a supervisão do treinador José Alçada; Campeão do Braga Open Boxe e atual campeão da Taça de Portugal

Livro preferido: “Arsène Lupin – Cavalheiro Ladrão”, de Maurice Leblanc

Filme preferido: “Ford v. Ferrari”, de James Mangold

Hobbies: Tocar guitarra elétrica e acústica; assistir a séries como “Breaking Bad”, “The Witcher” e “Brooklyn 99”; andar de bicicleta e “stand-up padle” nos dias quentes; jogar “Valorant” e “Need For Speedonline” com os amigos; e cozinhar aos fins de semana, principalmente carnes exóticas.

Sobre o autor

Efigénia Marques

Leave a Reply