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Vida (3)

Sinais do Tempo

P de peso, P de pobreza

Portugal vai despertando. Finalmente os técnicos ganharam coragem para anunciar que o Estado não tem rendimentos que suportem a despesa. As despesas aumentaram e os rendimentos diminuíram ou são insuficientes. Ambas as hipóteses podem coexistir.

Mas todos temos a noção que pagamos cada vez mais ao Estado para nos proteger.

Chegou a altura da sociedade portuguesa discutir se pretende manter um modelo de sociedade capitalista social democrata, em que o estado previdência assegura tudo o que os políticos prometem e que os sindicatos exigem, enquanto vai tentando extorquir cada vez mais do bolso de quem trabalha. O modelo entrou em pré falência.

Todos nós (uns mais do que outros) afirmamos que pagamos para os reformados (do Banco de Portugal, da Assembleia da Republica, das Autarquias, do Regime Geral, da Caixa Geral de Aposentações e tantos outras), as comparticipações dos medicamentos, as consultas, as hospitalizações (caríssimas, diga-se), o ensino dos nossos filhos, a nossa segurança, as estradas, o aeroporto da Ota, os Polis, o TGV (que parará em todos as vilas e cidades), os Tribunais, isto é, tudo o que contribui para o nosso bem estar.

Nem discuto que o conceito de solidariedade das democracias ocidentais modernas nos transmite segurança e nos permite viver melhor o presente sem nos preocuparmos com o futuro. Mas o problema é quando essa sensação de segurança ronda a fronteira da irresponsabilidade. Assuma-se que só assim se justifica que os destinos turísticos para o Brasil e América Central estejam esgotados mais uma vez este Verão. Actualmente todos sentimos que ao pagar os nossos descontos e impostos, passamos ao Estado a obrigação de cuidar de nós até à morte como de um casamento se tratasse (nos bons e nos maus momentos, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença). Vamos exigindo mais e melhor, desde que o Estado pague.

Afirmava-se num debate televisivo que 7 por cento do PIB paga as reformas aos pensionistas do regime da segurança social e 4 por cento do PIB aos pensionistas da Caixa Geral de Aposentações. Atendendo a que os últimos constituem sensivelmente 13% do total, concluímos que os funcionários públicos auferem melhores reformas, porque ganharam e descontaram mais. Paga-se mais no sector público com medo que os funcionários fujam para o sector privado?

Nada disto estaria em discussão se o nosso PIB fosse elevado, mas a realidade é que somos pobres e não estamos a investir ou a produzir para enriquecer. Mas o Estado não se importou e continuou a engordar serviços e a alimentá-los. Foi incapaz de dizer que não podia operar todos os que queriam, que não podia comparticipar indiscriminadamente os exames auxiliares de diagnóstico ou os tratamentos, que as reformas não podiam ser iguais aos vencimentos, que todas as auto-estradas precisavam de portagens, que a Expo 98 e o Euro 2004 obrigavam a investimentos elevados de difícil retorno, que não havia dinheiro para suportar as despesas dos Jardins de Infância ou da Pré-Primária e que as Universidades ou os Politécnicos custam demasiado dinheiro não podendo proliferar como cogumelos.

Temos um Estado com excesso ponderal ou obeso. Todos sabemos como é difícil emagrecer uns quilitos, mas também sabemos que há que tentar. Nem sempre as dietas resultam, mas há alternativas. Chegou a altura dos políticos abandonarem as promessas fáceis. Assumirem escolhas realistas. Prepararem-se para a contestação dita social, de quem não entende ou não quer entender.

Afinal de contas é tudo um problema de peso e pobreza.

Por: João Santiago Correia

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