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UMO

Coisas…

Acabadinho de chegar de umas curtas férias, fui à procura de novidades. Passei os olhos na imprensa cor-de-rosa, actualizei-me no que diz respeito a casamentos, namoros, divórcios, festas, reuniões do conselho de ministros e outras palhaçadas e acabei, naturalmente, por passar os olhos nos jornais cá do burgo. Não esperava mais do que ficar a conhecer o número de mortos no IP5, os projectos políticos do PPD ou a lista de arraiais e romarias. Puro engano.

O conselho de administração do hospital Sousa Martins deu, em pleno Agosto, sinal de vida colocando a rodar a já famosa UMO (Unidade Móvel de Oftalmologia). Traduzindo, esta consiste num veículo destinada a percorrer o país, equipado com sofisticado material, evitando dessa forma que tenham que ser os candidatos a doentes a procurar o médico. O inovador projecto, cuja paternidade é do anterior conselho de administração do hospital, esteve em banho-maria durante uma eternidade por alegada falta de acordo com os médicos do serviço de oftalmologia sem cuja cooperação é afinal inútil o funcionamento da unidade.

Finalmente o fumo branco. A viatura lá saiu, equipada a rigor, dirigindo-se a Videmonte (porquê Videmonte?) acompanhada por uma bela notícia de jornal, para mostrar ao mundo quanto se trabalha aqui para os lados da Guarda, em pleno Agosto.

Terá sido realmente assim?

Lendo com atenção a notícia publicada no Interior da passada semana, com direito a título de 1ª página e a uma foto que “por acaso” emoldurava três ilustres elementos do actual CA do hospital (os pais do projecto ficaram de fora…), rapidamente se percebe que há algo que não bate certo. De facto, no dia de estreia da viatura, estavam de férias o director do serviço de oftalmologia bem como o oftalmologista coordenador da unidade que, inclusivamente, desconhecia a inauguração. Dentro da viatura, para além do motorista, entrevia-se uma técnica de ortóptica que não foi, com certeza, quem definiu os critérios da intervenção ou as populações a rastrear para além de não possuir habilitações para manipular alguma da sofisticada aparelhagem existente na viatura (a propósito, ainda gostava de saber o que é um “medidor de doenças da retina”!).

Assim sendo, questiona-se naturalmente a verdadeira razão pela qual esteve a viatura parada durante quase 2 anos. A invocação de uma falta de acordo com os médicos é desmentida pela constatação de que, afinal, eles não foram precisos para a viatura ser mobilizada com muita pompa e pouca circunstância. Pelos vistos, nem o próprio coordenador foi tido ou achado. Mais se estranha que pessoas que percebem tanto de oftalmologia como eu de paralelas assimétricas, venham para os jornais dissertar sobre o projecto, na ausência de qualquer médico da especialidade.

Abreviando a coisa, perguntar-se-á: quem dará a cara pelo tipo de intervenção a realizar, quem irá validar os diagnósticos e assumir os tratamentos das patologias, responsabilizando-se pelas naturais expectativas criadas junto das pessoas? Quem irá fazê-lo se não há, aparentemente, um oftalmologista à frente do projecto ou médicos suficientes para lhe dar sequência? Resposta provável: será a mesma pessoa que deu ordem de marcha à viatura, sem médico, sem coordenação médica mas com notícia no jornal?

Quem terá sido?

Por: António Matos Godinho

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