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Uma saída preocupante

A demissão de José Rodrigues dos Santos e da sua equipa da direcção da RTP é muito preocupante. Não se trata, como alguns quiseram fazer crer, de uma simples birra à volta de um correspondente ou de um qualquer pretexto. Bastava conhecer os sinais anteriores de mal-estar para ver que existiu, além da situação já de si grave que é a intromissão abusiva da Administração numa matéria editorial, uma gota que fez transbordar o copo. Porque é bom não esquecer que há semanas este jornal noticiara que o Governo gostaria de substituir a equipa que dirigia a informação no canal do Estado.

Assim, foi uma direcção já minada pelo Governo que a administração da RTP colocou entre a espada e a parede com a ideia totalmente perversa de ser ela a escolher uma correspondente em Madrid. Qualquer administração pode, por diversas formas, vetar ou impedir trabalhos jornalísticos, nomeadamente através de restrições económicas, além de ter um natural poder de influência sobre as direcções editoriais. Mas nunca se tinha visto uma administração pretender escolher um jornalista para desempenhar uma determinada tarefa contra a opinião do próprio director desse jornalista. Foi, no entanto, o que aconteceu na RTP.

Mais preocupante, ainda, se torna a saída de José Rodrigues dos Santos quando se pode constatar que o seu tempo à frente da RTP correspondeu a um período de grande isenção e bom senso na televisão pública. Apesar de todas as contingências, a informação era sólida, era serena e tinha os seus alinhamentos o mais possível de acordo com a importância pública dos temas, ao contrário da preferência pelas abordagens emocionais agora tão na moda.

Por último, numa altura em que todas as suspeitas de tentativa de manipulação da informação recaem sobre o poder, a substituição da direcção da RTP aparece como mais um passo na submissão dos órgãos de comunicação que o Governo pode, por uma ou outra via, influenciar.

Pode ser que a RTP não volte aos tempos oficiosos. Mas confesso que é esse o meu mais sério receio.

Por: Henrique Monteiro *

* Rede Expresso

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