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Uma interjeição

Bilhete Postal

Há exclamações que saem da alma, são gritos que acompanham a frustração e outros a alegria suprema. Ele há força de exclamações que vão do sétimo céu ao quinto dos infernos. Falo da asneira que surge no entalar do dedo, na palavra que rompe depois do dedo perfurado, na dor falada quando o carro risca o portão, na raiva que cresce do insulto do chefe, da avaliação mal interiorizada. Mas descubro com frequência que as palavras rebentando da garganta são as mesmas para o bem e o mal, trazendo tons diferentes. Pronunciam-se de modo maroto, ou de modo intenso, ou de maneira feroz. A mesma palavra cresce entre dentes na derrota, ou adocica-se na vitória. Ele é um arroz forte se dói, ou uma arrozada intensa de gargalhadas à mistura no golo apaixonado. “Ora toma” pode vir com gestos ou com sorriso. Pode ser flor e pode ser dedo do meio espetado. Mas mesmo quando é dedo no ar pode ser amizade contrariada e outras pode ser insulto transparente e grosso. Assim, no uso destas interjeições mandamos as pessoas passear ou acariciamos-lhes o ego. Exclamações são frequentes por todo o Portugal mas enchem mais o discurso descuidado de alguns que a solenidade construída de outros. Assim, é mais pujante um berro exclamado com fato e gravata que em tronco nu. O casca-grossa repete-se e perde intensidade. O “finezas” desconstrói o discurso tornando-o picante. Um dia já expliquei este problema. No Porto, muita asneira já se tornou pontuação. O ponto e vírgula e o ponto final dão já dois palavrões. No sul, no Alentejo, por exemplo, fica mais surpreendente ouvir uma voz a descrever intimidades. Mas ele há cascas-grossas por todo o lado e estão em alargamento exponencial.

Por: Diogo Cabrita

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