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Um país em que nada se adia, contratam-se estudos, pedem-se relatórios técnicos ou grupos de trabalho…

O primeiro-ministro, António Costa, afirmou por estes dias que o país está a perder tempo ao adiar o processo de descentralização para as autarquias.

Alguém deveria informar o primeiro-ministro que foi o grupo parlamentar do Partido Socialista que pediu o adiamento da votação dos diplomas para a próxima sessão legislativa. Não foi a oposição!

Alguém deveria também recordar o primeiro-ministro que é o seu Governo quem não conseguiu consensualizar com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) o teor dos anteprojetos dos decretos-leis sectoriais. Finalmente, alguém deveria recordar o primeiro-ministro que a proposta de uma nova Lei das Finanças Locais, diploma essencial para a materialização da descentralização de competências, ainda não chegou ao Parlamento apesar das sucessivas promessas do seu ministro-adjunto.

Ninguém bate António Costa na demagogia, falta de vergonha e mentira!

Encerramentos “encapotados”

Não sei se por estarmos em época de férias, se devido às enormes tragédias que assolaram o país, passou completamente desapercebida a questão de, na sequência da publicação do Aviso nº 5332/2017, do Conselho Superior da Magistratura, relativo à “Abertura do Movimento Judicial Ordinário de 2017”, ter resultado a agregações de 5 Juízos, nos Tribunais das Comarcas de Bragança (Miranda do Douro e Mougadouro), Évora (Redondo e Reguengos de Monsaraz), Guarda (Pinhel e Figueira de Castelo Rodrigo), Viseu (São Pedro do Sul e Oliveira de Frades) e (Nelas e Sátão).

Nos termos da Lei da Organização do Sistema Judiciário esta possibilidade de agregação apenas é permitida através de norma habilitante, ou seja, expressamente através de portaria do membro do Governo responsável pela área da Justiça. Este movimento que ordena estas agregações veio, pois, ao arrepio das normas legais aplicáveis, para além de que não ter havido, segundo informações obtidas, qualquer solicitação por parte dos juízes presidentes dos tribunais judiciais para que a Senhora Ministra da Justiça procedesse neste sentido.

Aquilo que estas agregações traduzem mais não é que o “encerramento encapotado” de cinco tribunais, no interior do país, dois dos quais no nosso distrito da Guarda, porque em dez destas comarcas apenas foram colocados cinco magistrados, realizando apenas diligências nalguns dias da semana.

Isto contraria em absoluto a bandeira do atual Governo, que pugnava pela abertura (e reabertura) de tribunais, que ora através de expedientes de duvidosa legalidade, encerra.

Os deputados do PSD, subscritores de uma pergunta dirigida ao Governo – até agora sem qualquer resposta – manifestaram desde logo a sua total indignação pelo facto da Senhora Ministra da Justiça não ter recebido os autarcas destas localidades (e continuar ainda hoje sem os receber) em tempo útil e que lhes permitiria ter reagido a tal injusta e “obscura” decisão, sem quaisquer critérios conhecidos, ou previamente anunciados, como os números da movimentação processual, ou outros.

A lista

Perante a exigência pública da divulgação da lista de vítimas em Pedrógão, o PS partiu para o contra-ataque, acusando a direita de imoralidade ao tentar fazer política com os mortos. Esta tática é sobejamente conhecida e vem do tempo do outro “senhor”. Quando se vê em dificuldades, o PS passa da defesa ao ataque e desvia as atenções para os adversários.

Mas a novidade nesta matéria é que foi finalmente abandonado o agitar patético do segredo de justiça, essa figura jurídica que foi pensada e feita para proteger as diligências de investigação e não para servir de anteparo para esconder verdades politicamente inconvenientes.

Não era admissível o clima de dúvidas acerca do número de mortos nesta tragédia, nem tolerável a gestão política e comunicacional com questões desta natureza.

Não é aceitável que o PS não tenha permitido que fosse aprovado o projeto de lei urgente do PSD para criar um mecanismo extrajudicial de reparação às famílias dos falecidos e aos feridos graves. É incompreensível que até ao momento não tenha chegado ao terreno um cêntimo do dinheiro público e do muito privado que a sociedade portuguesa angariou.

Como já alguém sabiamente escreveu: «… Passou um mês e ainda ninguém pediu desculpa, ainda ninguém assumiu responsabilidades, ainda ninguém teve a decência para dizer “falhei” ou “o meu serviço falhou”, “o meu ministério falhou”. Morreram 64 pessoas perante evidentes falhas humanas de curto e longo prazo, mas um Governo democrático e o estado da democracia têm procurado o refúgio que o Estado Novo procurou nas cheias de 1967: a mesma desresponsabilização através das costas largas da mãe natureza, o mesmo desrespeito pelas vítimas, o mesmo desprezo pelos factos. Ou seja, um gigantesco pós-verdade».

Verdade insofismável, nunca a máxima “as pessoas não são números” teve tão completa e inequívoca aplicação!

Por: Ângela Guerra

* Deputada do PSD na Assembleia da República eleita pelo círculo da Guarda e presidente da Assembleia Municipal de Pinhel

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