1. Sem surpresa, há um ano Marcelo Rebelo de Sousa foi eleito Presidente da República. Um ano em que Marcelo conseguiu recuperar a função presidencial; um ano de Presidente com as pessoas ou, como se dizia antigamente, um Presidente com o povo. Uma presidência que tem muito mais a ver com a de Mário Soares do que com a de Cavaco Silva; uma presidência de proximidade, de estar na rua, uma presidência que recuperou a vertente presidencial do sistema, numa altura em que muitos questionavam o semipresidencialismo.
No pressuposto de que a política interna de um país não pode viver em clima de instabilidade, na confusão permanente, que muitos esperavam depois da invenção da “geringonça” por António Costa, o Presidente da República revelou-se um fator de estabilidade, um baluarte de recuperação do crédito dos políticos (num tempo em que cada vez mais pessoas exprimem repúdio pelos partidos e pelo políticos) e o presidente de todos os portugueses. Marcelo Rebelo de Sousa, para além do estilo, impôs um caminho, um rumo, que contribuiu e contribui de forma decisiva para a estabilidade do país.
Com Marcelo acabaram-se as «fontes da presidência», para termos o Presidente como única “fonte” da presidência (assumindo, per si, ser o porta-voz e a única voz autorizada da presidência, acabando com os rumores e os boatos sobre o que quereria ou não dizer o presidente com este ou aquele gesto ou palavras – ruído com que convivemos nos dez anos anteriores). Mas esta opção tem riscos, muitos riscos, e por isso ouvimos tantas críticas ao estilo omnipresente de Marcelo Rebelo de Sousa: ao estar sempre presente no espectro comunicacional, tem de falar de tudo, e a palavra do Presidente perde relevância e vulgariza-se. O comentário permanente sobre todos os assuntos desgasta a palavra do Presidente; o Presidente não tem, de facto, de ser o explicador de tudo o que ocorre. E muito menos, explicar as medidas do governo e as opções do primeiro-ministro. O Presidente tem de estar acima do governo, longe das tricas partidárias e equidistante da vida mundana dos políticos e dos portugueses. Mas se isto é verdade, também é verdade que Marcelo o faz de forma genuína, com enorme generosidade, com naturalidade, elevando a autoestima das pessoas e dando confiança aos cidadãos – um processo definitivo para promover a estabilidade política e o clima de confiança extraordinariamente positivo.
Um ano depois, Marcelo já deixou a sua marca e o seu contributo para um Portugal menos crispado, agora pode iniciar um tempo de alguma equidistância, para preservar a sua palavra, como a “última” palavra – cujo direito Marcelo recuperou para a Presidência.
2. Com a tomada de posse de Donald Trump, como presidente dos Estados Unidos, os receios do mundo ficaram em evidência. De facto, os que esperávamos que a chegada ao cargo “subjugasse” o novo líder da América à realidade democrática e ao cumprimento das regras e costumes da maior potência do mundo, lamentavelmente, vemos como a retórica de campanha pode impor-se como orientação de governo. Curiosamente, a postura belicista de Trump pode ter um efeito perverso no mundo, mas poderá levar à união dos europeus – esperar para ver.
3. O Manifesto: Cidadãos Contra o “Acordo Ortográfico” de 1990 (AO90), entre os quais me incluo, e subscrito por mais de uma centena de personalidades (como Eduardo Lourenço, António Lobo Antunes, António Barreto, Pedro Mexia ou José Pacheco Pereira) vem reabrir de forma definitiva a discussão sobre o Acordo Ortográfico. O “Manifesto” considera o AO90 um «fiasco político, linguístico, social, cultural, jurídico e económico». E caberá agora à Assembleia da República (a comissão parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto aprovou uma proposta para a criação de um grupo de trabalho) avaliar o impacto da aplicação do AO90. Esperemos que seja reposto o Acordo Ortográfico de 1945 e que as alterações introduzidas pelo AO90 sejam revistas. E depressa, porque as novas gerações não merecem tanta trapalhada. E os mais velhos querem voltar a escrever sem medo de dar erros.
Luis Baptista-Martins