O último ano letivo trouxe à Universidade da Beira Interior o maior número de estudantes de sempre, quase 7.300, mas a instituição pensa já num novo recorde no próximo ano.
Numa cidade que ainda chora a queda dos lanifícios, ergueu-se, nas mesmas paredes onde antes existiram fábricas, uma universidade que se tornou um caso de sucesso. De todos os pontos do país, mas não só, a Universidade da Beira Interior (UBI) tem conquistado alunos em todo o mundo. Em 2017-18 a instituição beirã teve a maior enchente de sempre e conseguiu uma taxa de ocupação de 98 por cento só no concurso nacional de acesso.
A população foge cada vez mais para os grandes centros, mas a universidade sediada na Covilhã luta de forma imaginativa para contrariar a tendência. No próximo ano, por decisão do Ministério da Ciência e do Ensino Superior, haverá menos 5 por cento das vagas nas instituições de ensino superior de Lisboa e Porto para serem redistribuídas pelas instituições do interior. A UBI ganha assim mais 62 vagas no concurso nacional de acesso, passando das 1.245 do ano transacto para as 1.307. Um processo já resolvido internamente, com todas as vagas distribuídas pelos cursos, falta que cheguem os novos alunos, mas esta também não é uma questão que cause dor de cabeça: «Este ano acreditamos que podemos subir novamente a percentagem de colocações em função da redistribuição», afirma o vice-reitor para as áreas de Ensino, Internacionalização e Saídas Profissionais.
É, de resto, essa a aposta que tem sido feita pela instituição, «um esforço na divulgação da universidade», pois, segundo João Canavilhas, «o único problema que havia era o desconhecimento em relação à UBI». Neste contexto, a promoção da universidade foi feita em cerca de 100 escolas de todo o país e também nas feiras Qualifica e Futurália. São ainda realizadas outras iniciativas «para públicos específicos», como a Universidade de Verão e de Inverno e a Academia Júnior de Ciência. Ações que levam o responsável a afirmar que «este ano vamos ficar mais ou menos dentro dos mesmos números». Quanto aos estudantes de segundo ciclo, «na primeira fase de colocação há já mais 57 por cento de colocados em relação a 2017-18». São sinais de que no próximo ano letivo haverá «um crescimento em relação a este, em que atingimos os 7.262 alunos, o número mais alto de sempre de estudantes na UBI e alimentamos a esperança de vir a bater novamente o recorde do número máximo de alunos», afirma João Canavilhas.
Mas há muito que os responsáveis da UBI deixaram de se contentar apenas com os números do concurso nacional e, antecipando já um “inverno demográfico” que há muito ameaça chegar, a UBI tem apostado nos estudantes internacionais. Decorridas duas fases de candidaturas de estudantes estrangeiros «estamos a registar um acréscimo em relação ao ano passado nas duas primeiras fases», com 75 por cento das vagas já preenchidas. Neste caso, a divulgação da oferta curricular da universidade é feita através das redes sociais e da presença, através de escolas mediadoras, no Brasil e em Angola. Mas o objetivo de atrair alunos estrangeiros «não é apenas uma questão de sobrevivência. A nossa luta é ir buscar os melhores estudantes do país e os internacionais», afirma o docente.
UBI oferece propinas a candidatos com média superior a 18
É nessa busca pelos melhores alunos que foram criadas as bolsas “+UBI”, que consistem na oferta do valor das propinas a todos os alunos que concorram através do concurso nacional com média superior a 18 e escolham a UBI na primeira opção.
Um apoio que, segundo o vice-reitor, vem dar também uma ajuda na captação de alunos dos grandes centros: «Se há alunos das grandes cidades que podem não vir por causa dos custos associados a essa deslocação, têm aqui uma forma de minimizar as despesas», constata. Os ubianos podem também beneficiar das bolsas “+Superior”, das bolsas da DGES e do Fundo de Apoio Social, destinado a alunos com dificuldades económicas e que, em troca de serviços prestados à instituição, têm o apoio no mesmo valor das propinas.
A UBI tem ainda uma listagem de todos os municípios que apoiam a entrada dos seus munícipes no ensino superior e tem protocolos com empresas que também financiam bolsas. Todas estas questões podem ser esclarecidas através de uma linha de apoio criada recentemente e da campanha “Não Desistas”. Um trabalho que tem como objetivo «criar um ecossistema para que ninguém desista e aqui, na Covilhã, têm oportunidade de continuar os estudos».
Estudantes são uma rampa de lançamento da economia local
A Universidade da Beira Interior habituou-se a formar pessoas para o mundo e de todo o mundo. A cidade e a região não têm capacidade de absorver todos os licenciados, «mas sabemos que há setores onde as pessoas ficam, como a saúde, eletromecânica, têxtil, informática, entre outras. Há empresas que se deslocam para cá e ficam com os nossos recursos humanos, embora não seja uma fixação em bloco», adianta João Canavilhas.
Cerca de 85 por cento dos alunos inscritos na UBI são de fora, pelo que o vice-reitor considera que já seria positiva «a retenção dos 15 por cento de estudantes da região depois de terminarem os estudos», mas acredita que se tem conseguido mais do que isso. «Muitos dos nossos jovens que acabam os cursos, de dentro e fora de região, vão ficando e é isso que faz com que esta “corda” entre Guarda e Castelo Branco, que embora vá perdendo população, seja a um ritmo menor daquilo que que acontece noutras regiões onde não existe ensino superior», garante o responsável.
Não há dúvidas que a UBI mexe diretamente com a vida económica da Covilhã e também da região. Entre alunos, docentes e funcionários, a UBI envolve no dia-a-dia da cidade cerca de 5.500 pessoas. João Canavilhas diz não ser ao acaso que estejam «em recuperação vários prédios que estavam devolutos na zona histórica». São obras feitas por privados, «que estão a ser pensadas para alojamento de estudantes». A oferta tem crescido nos últimos anos «e a procura continua». Também na restauração o docente assume que «tem hoje uma oferta mais variada do que aquilo que tinha há dois anos». O aumento de alunos «trouxe mais investimentos locais».
Pensar no futuro
A UBI, que começou por ser Politécnico da Covilhã em 1973, vive hoje o melhor momento de sempre, embora enfrente há vários anos um problema de subfinanciamento que põe em causa o seu futuro.
«Esperemos que a fórmula de financiamento seja revista e nos seja atribuído aquilo a que temos direito», sublinha João Canavilhas, acrescentando que só assim «podemos fazer aquilo que é já uma necessidade, a expansão física de alguns edifícios da universidade». Segundo o responsável, «estamos a chegar a um ponto que mesmo com mais procura não vamos conseguir dar resposta porque não temos nem espaço, nem recursos humanos». Outra necessidade que se coloca, e uma vez que a UBI e a cidade não são independentes, é que «a vida cultural e desportiva tem que acompanhar o aumento de estudantes», e por agora falta «uma oferta mais vasta e mais variada». Há muito que o papel da UBI deixou de se resumir a licenciar pessoas, «queremos fundamentalmente formar cidadãos e pessoas preparadas em todas as suas vertentes».
Quanto ao futuro das instituições de ensino superior sediadas no interior, João Canavilhas considera que será necessário «deslocar mais estudantes do Porto e Lisboa». Adianta ainda que a «revolução digital» das universidades está cada vez mais perto o que obriga as universidades a «prepararem-se», pois o aprofundamento do processo de Bolonha prevê o ensino à distância, o que pode significar menos alunos no dia-a-dia das cidades. «Algo que temos de começar já a pensar, para minimizar os impactos na cidade, pois mais mil ou menos mil alunos na Covilhã faz uma grande diferença».
Ana Eugénia Inácio