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Sousa Martins transformado em hospital-empresa em 2005

Mudança de estatuto foi anunciada pelo Ministro da Saúde na terça-feira

O Sousa Martins, na Guarda, passará a ser um hospital-empresa em 2005, juntamente com a grande maioria das principais unidades distritais existentes no país. O anúncio foi feito terça-feira pelo Ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira, que exclui desta medida os cinco hospitais universitários e 39 outras unidades, que representam 30 por cento da rede pública. Ao todo são mais 25 hospitais públicos que passarão a ter gestão privada a partir de Janeiro do próximo ano, juntando-se às 34 Sociedades Anónimas de Capitais Públicos criados em 2002. Previsto está também a criação de uma “holding” que vai substituir a Unidade de Missão, noticiou a Antena 1.

Segundo o ministério, o processo de empresarialização hospitalar insere-se numa política de «modernização e revitalização» do Serviço Nacional de Saúde (SNS) assente numa gestão inovadora com carácter empresarial orientada para a satisfação das necessidades do utente. Pretende-se que estas unidades, dotadas de maior agilidade e autonomia, disponibilizem um melhor acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde, e promovam o desenvolvimento e o mérito dos respectivos profissionais. Um regime que vigora no Centro Hospitalar da Cova da Beira (CHCB) desde Outubro de 2002, data da aprovação em Conselho de Ministros deste sistema e da entrada em vigor de leis próprias para os hospitais-empresas. Leis que utilizam como critérios fundamentais a flexibilização do regime de aquisição de bens e serviços, a avaliação dos profissionais por mérito e a contratação do pessoal. Sendo hospitais-empresas, estas unidades de saúde terão um capital social dotado pelo Ministério da Saúde e atribuído consoante os actos realizados de acordo com a tabela de preços que o Governo já aplicou. Quanto mais produzirem, mais ganham.

Na região Centro são seis os hospitais que já assumiram o novo estatuto. Além do Centro Hospitalar Cova da Beira, juntam-se os Hospitais de Leiria, Aveiro, S. Sebastião, Figueira da Foz e o Instituto de Oncologia de Coimbra. O decreto-lei aprovado pela maioria PSD/PP também condiciona a capacidade de endividamento dos hospitais. A nova lei estabelece que os hospitais apenas poderão endividar-se até dez por cento do capital social, embora possam surgir excepções, visto que as unidades de saúde podem atingir até 30 por cento de endividamento do capital social. Uma hipótese que apenas surge se os accionistas maioritários do hospital (Ministérios da Saúde e das Finanças) derem o aval positivo. Medidas de gestão que os sindicatos dos médicos e enfermeiros já criticaram, acusando o ministro Luís Filipe Pereira de querer «matar» o Serviço Nacional de Saúde através da empresarialização. «Esta é claramente uma via para privatizar a saúde e entregá-la nas mãos das seguradoras e dos grandes grupos económicos. Esta privatização da Saúde constitui um risco porque, como sociedade anónima, pode ir à falência e o seu capital social vendido», acusa o candidato à Ordem dos Médicos, José Boquinhas, citado pela agência Lusa, para quem este modelo apenas serve «para resolver os problemas das Finanças e não os da Saúde».

Também Manuel Delgado, presidente da Associação Portuguesa das Administrações Hospitalares, tece fortes críticas a esta opção. «Receio que se esteja a cometer erros porque não há evidências que os SA são melhores que os públicos. Pelo contrário, os resultados são pouco animadores em termos de custos e produção», adiantou, revelando que as unidades públicas apresentaram este ano «melhores resultados do que os SA, demonstrando que não há credibilidade quanto aos resultados da gestão privada». Citado pelo “Correio da Manhã”, o representante dos administradores sublinha que com esta medida «estamos perante o perigo de o Governo manipular os resultados e controlar, através da “holding”, os hospitais em termos financeiros, administrativos e políticos. Isto é um retrocesso e era impensável acontecer até há poucos anos». “O Interior” contactou alguns responsáveis na Guarda, no entanto, todos preferiram aguardar pela confirmação oficial para prestar declarações.

Futuro hospital nascerá das parcerias público-privadas

O futuro hospital da Guarda é uma das dez unidades a construir no âmbito das parcerias público-privadas e que servirão cerca de 25 por cento da população. O projecto anunciado para a cidade vai ocupar 80 mil metros quadrados e prevê um investimento de 75 milhões de euros. Terá entre 330 a 360 camas, as mesmas que as actuais do Sousa Martins, as mesmas especialidades e estava previsto que viesse a ser considerado como hospital geral em vez de distrital, servindo uma população estimada de 180 mil pessoas. O regime de parcerias público-privadas foi criado pelo Ministério da Saúde para ser aplicado na construção de dez novos hospitais – dois dos quais irão substituir unidades já em funcionamento – e determina que a sua edificação, financiamento e gestão sejam realizados por consórcios privados num período contratualmente definido que, no caso da Guarda, é de 99 anos. O decreto-lei que veio instituir este novo modelo de gestão, publicado em Abril de 2003, define como parceria público-privada «o contrato ou a união de contratos por via dos quais entidades privadas se obrigam, de forma duradora, perante um parceiro público, a assegurar o desenvolvimento de uma actividade (…)» e em que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento e pela exploração incumbem, «no todo ou em parte, ao parceiro privado». Entretanto, o encarregado de Missão para as Parcerias na Saúde já garantiu que todos os concursos públicos para a construção dos novos hospitais público-privado ficarão concluídos até ao final de 2006. No âmbito de um seminário realizado no Porto sobre a temática, Jorge Abreu Simões adiantou que o próximo ano será «de grande aceleração da implementação do programa, porque estamos a perspectivar quatro projectos hospitalares em Vila de Franca de Xira, Sintra, Hospital Central do Algarve e Guarda». Actualmente existem em Portugal quatro grandes grupos económicos dispostos a investir nos projectos das parcerias público-privadas, nomeadamente José de Mello Saúde, Hospitais Privados de Portugal (da Caixa Geral de Depósitos), Espírito Santo Saúde e o Grupo Português de Saúde (do Banco Português de Negócios). O primeiro já anunciou que tenciona concorrer à gestão dos dez novos hospitais, dos quais espera ganhar pelo menos quatro.

Luis Martins

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