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«Seria uma sorte se algum investidor de dimensão razoável olhasse para a Guarda como destino para os seus investimentos»

José Luís Carrilho de Almeida conduziu a Joalto pelas estradas do crescimento transformando uma pequena empresa de camionagem, de escala regional, numa das maiores empresas de transportes do país. Com interesses diversificados, do turismo ao imobiliário, a sua vida empresarial afastou-o da Guarda, mas continua atento ao que se passa no concelho de onde é originário e considera que a Guarda não soube aproveitar, no passado, os ciclos positivos da economia nacional e que «não aparece no radar» dos investidores. Tudo porque não «há trabalho, nem dinâmica» por parte da autarquia. Nesta entrevista, o empresário elogia o antigo presidente da Câmara Álvaro Guerreiro, dizendo que «não foi por culpa dele que a PLIE se converteu numa miragem». José Luís de Almeida é proprietário da Rádio Altitude e do jornal O INTERIOR.

P – Como empresário, que perceção tem da vida económica da Guarda, concelho e região?

R – Há muitos anos que a Guarda está parada. A Guarda não soube aproveitar os ciclos positivos, não estando por isso preparada para atravessar este ciclo de crise. Nesse sentido, é vítima privilegiada da atual conjuntura económica.

P – Estando radicado em Lisboa, nas suas relações empresariais, qual é a imagem que encontra entre empresas ou investidores sobre a Guarda?

R – A Guarda não aparece no radar, o mundo globalizou-se, os países, as regiões, as cidades têm que ser competitivas, têm que se saber vender, têm que criar condições e dar vantagens aos investidores. Seria uma sorte se algum investidor de dimensão razoável olhasse para a Guarda como destino para os seus investimentos. Só que a sorte dá muito trabalho e eu não vejo nem trabalho, nem dinâmica, antes pelo contrário.

P – O que tem faltado à Guarda para se desenvolver nestes últimos anos?

R – Exatamente aquilo que disse atrás – vontade efetiva de mudar, de aproveitar as condições positivas, defendê-las, publicitá-las e minimizar da forma possível as negativas. Mas para isso é preciso conhecê-las, estudá-las – diria que, numa perspetiva empresarial, seria necessário realizar uma análise “swot”, ou PFOA em português, de potencialidades, fraquezas, oportunidades e ameaças, para a gestão e planeamento estratégico do “produto” Guarda. Alguns estudos estão feitos e bem feitos, terão apenas que ser atualizados e naturalmente entendidos e aproveitados.

P – Como investidor, encontra na região polos de interesse, produtos ou sectores onde faça sentido investir?

R – Em relação à Guarda, eu decido muito mais com o coração do que com a razão, pelo que não sou a melhor pessoa para se colocar esta questão. De qualquer forma, existem produtos regionais com muito potencial e sectores agrícolas onde sinto algum dinamismo, como os vinhos, por exemplo. O turismo tem algum potencial, sobretudo de natureza, aventura, gastronómico, etc, onde existem alguns empresários com projetos de qualidade, mas aqui há muito trabalho a fazer, pois é preciso enquadrar os projetos e definir uma estratégia de promoção, mais da região que local. O sector logístico é vendável, haja vontade, saber e trabalho que as coisas aparecem.

P – Está anunciado o fim da sociedade PLIE. A Câmara diz que por culpa dos empresários, que não subscreveram o aumento de capital. Na sua opinião, por que é que este projeto não passou de uma miragem?

R – Se a Câmara diz que a culpa é ou foi dos empresários, eu gostaria primeiro que os nomeasse. De qualquer forma a Câmara Municipal é sócia maioritária da sociedade e o seu presidente é presidente do Conselho de Administração (CA) da sociedade, diria que, no mínimo, não é elegante acusar quem quer que seja, seu sócio na sociedade, na praça pública e deixaria a pergunta: a responsabilidade da Câmara é alguma? Aproveito a ocasião para lembrar e agradecer a Álvaro Guerreiro, ilustre representante, no passado, da autarquia no CA da PLIE, todo o seu empenho e dedicação ao projeto. Não foi com certeza por culpa dele que este projeto se converteu numa miragem.

P – Em tempos, apresentou uma proposta para a aquisição do Hotel Turismo da Guarda. O que faria se agora lhe propusessem adquirir o imóvel?

R – Há quem diga que não apresentei nenhuma proposta e na verdade não a apresentei formalmente porque me foi dito que a opção do executivo camarário estava tomada e confirmou-se. Como fui parte interessada, diria apenas que talvez não tenha sido a melhor opção. Quanto ao futuro, vejo cada vez mais difícil alguém se interessar pelo Hotel Turismo da Guarda, só com muita sorte. Mas como disse atrás, a sorte dá trabalho.

P – Estamos a três meses das eleições autárquicas, qual deve ser a principal preocupação do futuro presidente da Câmara?

R – A Guarda… A Guarda… A Guarda. Mas antes disso os eleitores têm a palavra e a sua principal preocupação deve ser também a Guarda e só depois a escolha do melhor candidato, indiferentemente do partido ou da “independência” do candidato. Se alguém quiser acertar contas com quem quer que seja com o seu voto está a prestar um mau serviço à Guarda. Muitos se queixam do destino da Guarda e da sua pouca sorte, uma parte da responsabilidade é individual, no momento em que os eleitores são chamados a votar e escolher.

P – Que opinião tem sobre os candidatos à autarquia da Guarda?

R – Tenho a melhor opinião pessoal de todos. Em termos políticos, é decisivo para a Guarda que o próximo presidente da Câmara rompa com o imobilismo e com o fatalismo, mas a população não pode mais ser enganada com promessas ou projetos megalómanos e irrealizáveis. A Guarda não necessita de aeroportos no Jarmelo, de campos de futebol para o Euro, não vai haver paragens do TGV na Guarda nem em Vila Franca das Naves – aliás, não vai haver TGV nos anos mais próximos –, não necessita de mais centros comerciais, de mais rotundas ou de fontes. Também não precisa de mais funcionários na Câmara ou nas empresas municipais, de escolas de turismo e de não sei mais o quê, sustentadas no Orçamento do Estado ou da autarquia, que não têm orçamento para o essencial quanto mais para fantasias. A Guarda precisa de dedicação e trabalho, dinamismo e competência, projetos viáveis e empenho da autarquia na criação de riqueza, de apoio institucional para projetos sustentáveis que criem emprego. Precisa também que a Câmara pague atempadamente aos seus fornecedores para não ser responsável por ciclos recessivos locais ou insolvências e consequente desemprego. A Guarda tem que oferecer felicidade aos seus habitantes, cultura e, sobretudo, esperança num futuro melhor, logo diferente do passado. Não sei se a melhor opção é apostar na continuidade. Eu sou há muito tempo a favor de uma rutura com o passado, não sei se é salutar ter o mesmo partido, o PS, a governar a autarquia há 38 anos.

Saúdo com satisfação o aparecimento de listas “independentes”, mas infelizmente os candidatos aparecem porque não foram escolhidos pelos partidos para serem candidatos, de qualquer forma saúdo a coragem de se candidatarem sem apoio partidário.

Saúdo, finalmente, o aparecimento do candidato do PSD, há muito desejado pelos seus militantes para concorrer à Câmara da Guarda e em quem depositam esperança na inversão de um longo ciclo local de recessão. Falei dos partidos, mas o essencial para mim são as pessoas, a sua disponibilidade, seriedade e competência. Pela minha parte estou disponível para ajudar, no que puder, para que seja restituída à Guarda a esperança que merece ter. Devo isso à terra do meu pai e onde fui feliz durante muitos anos.

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