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Retrato do republicano e inconformista João Gomes

Almeida Santos sugere que a Guarda erga busto ao advogado e publique os escritos pessoais para divulgar a sua «verdadeira dimensão intelectual»

Inconformista, republicano e grande referência local da luta anti-salazarista, João Gomes (1913-2003) foi homenageado na segunda-feira na Guarda, por ocasião dos 99 anos Implantação da República, com a edição do livro “João José Gomes – Homem do pensamento e da cultura/Homem da palavra e da acção”, da colecção “Gentes da Guarda”, organizada pela autarquia.

A obra assume traços foto-biográficos do advogado e fundador do PS e inclui 24 depoimentos de personalidades que com ele conviveram antes e depois do 25 de Abril, com destaque para os antigos Presidentes da República Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio, dos amigos Afonso Paiva, Alípio de Melo, Augusto César de Carvalho, Augusto Monteiro Valente, Andrade Pereira ou do neuro-cirurgião João Lobo Antunes, entre outros. Um rol extenso que prova a marca indelével que este humanista legou aos seus concidadãos mais próximos. Coordenada por António José Dias de Almeida, Mota da Romana e Isabel Gomes, filha do homenageado, a obra inclui ainda uma cronologia pessoa e geral, o que permite contextualizar a vida de João Gomes nos acontecimentos nacionais e mundiais. Além de fundador do PS, o advogado foi um republicano perseguido pela polícia política do antigo regime (PIDE), mas esteve sempre envolvido nas manifestações e candidaturas democráticas antes do 25 de Abril de 74, designadamente na de Norton de Matos, Humberto Delgado e outros.

Na Guarda, foi cronista político da Rádio Altitude, onde dirigia o espaço “Reflexões Políticas”, foi membro da Assembleia Municipal, presidente da Assembleia Distrital e Governador Civil. Personalidades como Jorge Sampaio, Mário Soares, António Almeida Santos, Abílio Curto, Carlos Luís, Armindo Ramos, José Rabaça, Alípio de Melo e Augusto Valente conviveram com João Gomes, designadamente na actividade política, recordando-o como um defensor das causas da Guarda e dos valores democráticos e republicanos. A autarquia justificou a homenagem, considerando João Gomes «uma referência de cidadania, de defesa de ideais e de intervenção política, um verdadeiro Homem da Guarda, político íntegro e advogado prestigiado». Na sessão, antecedida por uma romagem ao cemitério da cidade, Joaquim Valente disse ter admirado João Gomes pela «sua sede de liberdade», evocando os primeiros encontros em casa do seu pai no Vale do Mondego.

Já António Almeida Santos, antigo presidente da Assembleia da República e presidente do PS, confessou-se emocionado por, nesse dia, ter voltado a “reencontrar” o amigo João Gomes, mas também o general Sousa Dias. «Esta homenagem é pouco para estes dois grandes cidadãos e grandes republicanos. Por que não a Guarda erigir dois bustos a estes homens no ano do centenário da República», propôs, virando-se para o presidente da Câmara, comprometendo-se a regressar para inaugurar os monumentos. O também primeiro presidente da Assembleia Municipal da Guarda – «por insistência de João Gomes e Abílio Curto», disse – contou depois ter conhecido o advogado em 1949, por altura da campanha da candidatura de Norton de Matos no distrito. «Descobri o grande orador que era num comício em Gouveia e fiquei sempre ligado a ele desde então», referiu, recordando João Gomes como um «conversador admirável, de grande cultura e sabedoria, um pensador profundo da política e um amigo como há poucos, além de grande tribuno na barra dos tribunais».

Almeida Santos apontou-lhe também «um defeito», o de nunca ter publicado nada do que escreveu. «Quantos textos excelentes não haverá na sua biblioteca pessoal. Tenho a certeza que haverá pepitas de ouros entre os seus escritos e acho que isso pode ser corrigido», desafiou, propondo a compilação e publicação desses documentos de ordem pessoal para se conhecer a «verdadeira dimensão intelectual» de João Gomes. «Este livro é uma boa homenagem, mas não chega», reiterou.

Luis Martins Antigo presidente da Assembleia da República prometeu regressar para inaugurar monumentos a João Gomes e ao general Sousa Dias

Retrato do republicano e inconformista João
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