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Resta-nos a TAP

Editorial

Há cerca de 20 anos que a privatização da companhia aérea nacional é debatida e comentada como uma opção determinante para o futuro da TAP. Na verdade, mais de um governo colocou na sua agenda a venda de uma das marcas com que os portugueses se identificam. O debate à volta da privatização está carregado de preconceitos ideológicos, mas mesmo os governos socialistas ponderaram essa possibilidade. Estranhamente, o atual governo não só pretende vender a empresa como o ministro da Economia defendeu a venda por «convicção» e não por qualquer outra razão de ordem económica, estratégica ou de gestão.

Na ânsia de privatizar a TAP, e com o argumento de que era necessário injetar capital na empresa para a revitalizar, comprar aviões e modernizar, no início do século a “bandeira” portuguesa foi negociada e quase vendida à Swissair. Entretanto, e ainda decorriam negociações, a transportadora suíça faliu. Já com Passos Coelho no governo, numa novela surreal, foi negociada com o colombiano Gérman Eframovich com o compromisso deste assumir as dívidas da companhia e pagar 35 milhões de euros (!!) ao Estado português. O negócio exigia o pagamento de um “simples” sinal de 25 milhões que Efromovich afinal não tinha (quanto mais dinheiro para comprar aviões e modernizar a companhia) e por isso o negócio gorou-se.

Nos últimos cinco anos a transportadora aérea portuguesa cresceu de forma contínua, isto apesar de a empresa funcionar, para usar a expressão de Vital Moreira, como um condomínio dos sindicatos, onde se fazem greves para ter influência, poderes e direitos, e não para defender a empresa.

A TAP é a última grande bandeira nacional que não está em mãos estrangeiras. E se nos últimos cinco anos teve crescimento contínuo e o seu negócio (transporte aéreo) deu lucro porquê vendê-la? Se nessa dinâmica de crescimento a empresa já anunciou onze novas frotas e o aumento constante de passageiros, porque não continuar a ser do Estado português e todos os governantes a querem vender? Bom, porque a TAP, SGPS tem um passivo de mil milhões, o que implica custos financeiros insuportáveis. Ou seja, é preciso injetar dinheiro na TAP para a capitalizar pois em termos operacionais ela vai bem. E, querem vendê-la, porque continua a haver um entendimento de que os privados gerem melhor e com melhor estratégia do que o sector público – com a queda do Espírito Santo essa convicção ruiu e hoje já ninguém se atreve a afirmar que o melhor para uma empresa é ser privada (salvo pelo lado da liberdade na aplicação de regras e na despudorada exploração dos trabalhadores) e o negócio da PT também devia fazer meditar os mais crédulos no mercado e nas maravilhas dos grandes negócios.

O governo tem legitimidade para vender a companhia aérea e até pode aparecer algum grande investidor com capacidade para comprar e desenvolver a empresa, mas o mais provável é que isso não aconteça; e os sindicatos continuam mais preocupados em defender os pequenos interesses de grupo do que o superior interesse da empresa, mas desta vez talvez tenham alguma razão para contestarem uma privatização que tem mais de ideológico do que de empresarial. A TAP ainda é nossa e não a devíamos vender.

Luis Baptista-Martins

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