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Resposta a “O fim das baldas”

Na edição 323 deste jornal foi publicado um artigo de opinião de Luiz Carvalho com o título “Sementes de violência”. Mas é sobre o que escreve no subtítulo “O fim das baldas” que me vejo obrigado a dedicar algum tempo, como professor e contribuinte, para prestar algum esclarecimento ao autor bem como a outros, infelizmente muitos, que não são, nem sabem, o que é ser professor e que partilham da mesma opinião.

O autor começa por escrever «Só em faltas os professores portugueses totalizaram, o ano passado, à volta de 8 milhões de horas. É um número escandaloso». Escandaloso é escrever esse número sem, no entanto, saber ou acrescentar que essas ausências são todas justificadas. Mal ou bem, são justificadas e previstas na lei. Por outro lado, qualquer professor cumpre um horário rígido, isto é, se tem 8 horas de aulas para leccionar, são 8 horas de trabalho efectivo que cumpre. Ao contrário de outros trabalhos/empregos, também do sector público, com 7 ou 8 horas diárias para cumprir, constatamos serenamente que ao fim de um dia de trabalho são muito poucos aqueles que efectivamente cumpriram a totalidade das suas horas com trabalho. (…) Quantas vezes, muitos prolongam o seu intervalo para café e repetem esses intervalos vezes sem conta por dia? E quantas vezes abandonam o seu local de trabalho sob pretexto de serviço oficial e aproveitam para resolver assuntos particulares ou pessoais? Entre outras manobras. (…).

No entanto, esquecem-se que um professor não pode “baldar-se” no seu horário de trabalho, enquanto está metido numa sala de aula durante 90 minutos. Tem que aguentar, encenar, representar e apresentar boa disposição durante esse tempo. É claro que se abandonar a sala a meio de uma aula está sujeito a um procedimento disciplinar e corre o risco de ter falta injustificada. Acredito que não deve haver muitos casos destes. Mais, o trabalho de um professor está permanentemente a ser avaliado e vigiado, em primeiro lugar pelos alunos, depois por toda a sociedade, a começar pelos colegas até aos pais e encarregados de educação. No entanto, esquecem-se de valorizar e respeitar o trabalho do professor.

Depois o articulista continua: «E não estão aqui contabilizadas as horas que muitos sindicalistas-professores metem como justificativo para não exercerem o ofício. Nós contribuintes pagamos. É, aliás, para isso que existimos». Pois fique a saber que os direitos de um professor sindicalista não estão previstos na lei, mais uma vez. Mas o que mais me indigna nas suas afirmações é o termo “pagamos”. Afinal, tudo se resume ao dinheiro, à inveja da “vidinha boa de um professor”, ou de alguns professores. Uma inveja que se generalizou na sociedade em que muitos pensam, e também concordam, que um professor é muito bem pago para o trabalho que desenvolve. (…) Mas experimente ser professor. Por outro lado, sabe tão bem como eu que (…) não existe docente que fuja ao fisco, à Segurança Social ou à Caixa Geral de Aposentações – eu pelo menos não conheço -, ao contrário de muitos outros trabalhadores de outras profissões, todos sabemos quais. Mas desses ninguém fala ou interessa que se fale. Porquê?

(…).

Escreve também «Por tudo isto, e muito mais, a atitude de Sócrates em obrigar os professores a terem um horário suplementar para acompanharem os alunos com “furos” por falta de outros professores é uma grande medida». Parece que o senhor Luiz Carvalho, mais uma vez, não entendeu o objectivo do Ministério da Educação na aplicação desta medida. (…) está desculpado, pois nem mesmo os professores a entenderam muito bem e, pelos vistos, continuam sem perceber. (…) Se é uma grande medida ou não o tempo dirá.

Finalmente outro brilhante parágrafo (…): «Um professor trabalha em média 20 horas por semana… Um horário de luxo comparado com qualquer mortal que trabalhe numa profissão de risco físico ou de esforço mental». (…), deixe-me lembrar-lhe (…) que o horário de qualquer professor é sempre mais do que as meras 20, 22, 24, 26 ou mais horas semanais – está bem, em média, 20 horas -, que são efectivamente marcadas no horário. Sabemos muito bem que qualquer professor precisa de tempo, muito para além das 20 horas, para outras tarefas, (…), como preparar aulas, elaborar e corrigir testes, reuniões, etc. Quanto ao que li sobre risco físico, ou de esforço mental, só pode ter sido um pesadelo. Isto não está escrito, (…). Só de alguém muito inculto, numa das suas diarreias cerebrais seria capaz de revelar tamanha ignorância. Seria uma ofensa chamar ao articulista de ignorante ignóbil, até porque respeito os ignorantes.

Luís Veloso, professor do ensino secundário, Guarda

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