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Resignados, todavia…

Editorial

As medidas que o governo apresentou, primeiro por Passos Coelho e depois por Vítor Gaspar, conseguiram o descontentamento generalizado dos portugueses. A receita continua a ser a mesma, cortar nos rendimentos dos trabalhadores para alimentar o Estado. Porventura ainda nem sequer vamos ficar por aqui, mas, para já, não deixa de ser grotesco que no momento em que a Troika nos “dá” mais tempo, o governo nos brinde com mais austeridade.

A estratégia deste governo falhou, pois o resultado pretendido de 4,5% não será alcançado com todas as medidas de austeridade e deverá ficar um ponto acima do previsto. E se a Troika flexibilizou as exigências de cumprimento do memorando de entendimento e permite o adiamento no cumprimento das metas do défice é precisamente porque se concluiu que Portugal não consegue fazer o ajustamento exigido com esta política. Mas o mais grave é que a economia portuguesa não aguenta mais este protelar da retoma.

Estranhamente, o ministro Gaspar considera que quanto menos as pessoas ganharem melhor estará a economia nacional! Não se percebe como, se os trabalhadores ganham menos, o desemprego cresce e a disponibilidade financeira das famílias desaparece obviamente que a economia continuará a regredir.

Considerando que se preveem alterações nos escalões de IRS, Portugal vai passar a ser um país com baixos rendimentos mas com alta carga fiscal. O corte nas despesas afinal continua a ser adiado e o “monstro” continua tão grande que por muito que se esmifrem os portugueses não se consegue pagar. O mais estranho é que quanto mais impostos se pagam menos benefícios tem o contribuinte.

Na saúde, entre as taxas moderadoras e os custos das consultas ou dos tratamentos nas clinicas privadas, a que cada vez mais portugueses têm de recorrer, o contribuinte paga duplamente.

Na Educação, sem abono de família e sem apoio à natalidade, os pais têm de pagar a creche e o jardim-de-infância recorrendo quase sempre às IPSS a quem os Estado entrega milhões – aliás, a forma prodigiosa como a maioria das fundações, associações de beneficência e afins conseguiram substituir o Estado na sua função educacional, formativa e de beneficência é extraordinária, mas sempre, sempre, amparados pelo Orçamento de Estado. O contribuinte paga os serviços quando tem de recorrer a essas instituições, que têm contribuído sobremaneira para o desbaratar de dinheiros públicos e se em alguns casos a atividade social é relevante, a verdade é que é com o financiamento público (dos contribuintes) que se pagam investimentos em lares, escolas e afins e se pagam salários de muitos dirigentes. E depois os contribuintes têm outra vez de pagar ao recorrerem aos respetivos serviços.

Na Cultura, é cada um por si e as autarquias a apoiarem alguma coisa, o Estado não apoia nem incentiva a criação ou as artes…

Sem mais delongas, afinal para que é que pagamos impostos? Para pagarmos os erros e devaneios dos governantes; para pagarmos os salários de uns tantos privilegiados que continuam a ganhar em regime excecional; para custearmos os vícios e a luxúria de uns poucos que vivem à volta do poder, dos partidos e das instituições e empresas que comem à mesa do orçamento… O mexilhão que se lixe. Por isso, com o anúncio destas medidas o país atingiu o zénite da resignação. A partir de agora, o conflito social é eminente. Passos Coelho teve o seu “hara kiri”.

Luis Baptista-Martins

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