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Renovar o país

Editorial

De acordo com os dados revelados esta semana pelo INE, Portugal perdeu na última década meio milhão de residentes. Pior: os habitantes entre os 15 e os 29 anos valem apenas 17 por cento da população, a percentagem mais baixa de sempre para esta faixa etária. Ou seja, entre a diminuição de população jovem, resultado da baixa taxa de natalidade e o acentuar da emigração, Portugal é cada vez mais um país envelhecido, um país onde os jovens não querem nem podem ficar.

Em 2012, emigraram 53 mil jovens; desde 2009 mais de 200 mil. Mas o total de emigrantes foi muito superior: estima-se que entre 2008 e 2012 uma média de 80 mil portugueses por ano emigraram – em 2012 terão emigrado 95 mil portugueses. Contrariando a narrativa habitual, a maioria dos que partem não tem formação superior e embarcam na aventura de partir com o mesmo espírito dos que partiram ao longo de décadas para França, Luxemburgo ou Suíça… Agora partem para Inglaterra (em 2013 cerca de 30 mil), mas continuam a repetir destinos como a Suíça (29 mil em 2013), Alemanha (11 mil em 2013) e a França (8 mil em 2013). Vão à procura de emprego, de melhores condições de vida para os próprios e familiares, tal como ocorreu com as gerações anteriores. Já não partem a “salto” como outrora, nem se instalam no “bidonville”, mas partem tendo por amparo a força das mãos, a audácia e a capacidade de trabalho… e sofrimento. Com facilidades de movimento que as anteriores gerações não conheceram, mas com o mesmo pragmatismo de sempre: trabalhar, poupar e regressar – independentemente do sucesso de cada um, regressar é o desígnio da maioria, porém, a adaptação e as contingências económicas e sociais acabarão por moldar o sonho…

E há também os diplomados que partem, cerca de 15 por cento do total. Jovens que tiraram um curso superior na convicção de que esse era o caminho que lhes abriria as portas do futuro, mas não foi… e por isso têm de escolher entre a precariedade e a emigração. Pior: os que ficam deparam-se com a estranha e extraordinária situação de auferirem rendimentos inferiores às gerações anteriores – segundo os dados do INE, o rendimento salarial médio mensal líquido dos jovens trabalhadores foi entre 2011 e 2013 inferior em 23,2% ao da generalidade dos trabalhadores por conta de outrem. Ou seja, em média, enquanto a população com menos de 30 anos ganha 622 euros, os colegas mais velhos, ainda que a fazer uma função similar, recebem 822 euros. Assim, e muito para além da falta de trabalho, obviamente, os jovens optam por partir, por procurar além-fronteiras o cumprimento dos sonhos que por cá vão sendo adiados.

A emigração, per si, não é um problema, o facto de as pessoas saírem do país, de desenvolverem experiência e conhecimento em outras paragens é aliás positivo, o problema é que cada vez mais jovens partem com um anátema, com uma carga negativa em relação à pátria, com um sentimento de revolta compreensível mas injustificado, porque o país não consegue criar emprego. E pior: partem com vontade de quebrar os laços. O grande desafio das administrações e das elites deve ser, precisamente, construir soluções e criar condições para fazer regressar estes jovens, pois, entretanto, a sua experiência e conhecimento adquirido no exterior serão extraordinariamente enriquecedores para uma nova organização e um imenso contributo para melhorar a competitividade da economia. O país falhou na construção do futuro para os jovens, mas não pode falhar a oportunidade de aproveitar o seu conhecimento e aprender com eles a fazer um novo país.

Luis Baptista-Martins

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