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Regionalização para quando?

Crónica Política

Muitos apregoam a necessidade de descentralizar e sobretudo a valorização das decisões na plataforma regional. No entanto, num quadro imperativo da modernização administrativa, esta medida é indissociável da descentralização do Estado, num quadro de fortalecimento da unidade e coesão nacionais e do reforço da confiança dos cidadãos na administração pública, preocupações acauteladas há quatro décadas, por várias vezes reconfirmadas, quando na Constituição da República foi consignado o Poder Local Democrático, consubstanciado nas freguesias, nos municípios e nas regiões administrativas, enquanto pilares fundamentais do Estado de Direito Democrático, com autonomia administrativa e financeira própria e específica, em consonância com uma moderna repartição de funções entre as Administrações Central e Local, tal como acontece nos demais países que apostam na descentralização.

Não compreendo as razões da não implementação efetiva da descentralização da Administração Pública – algumas vezes tentada, como com a aprovação da Lei-quadro das Regiões Administrativas, mas sempre adiada, com reconhecidos prejuízos para os territórios e para os cidadãos – constituirá um pilar em falta no triângulo do Poder Local constitucional, o pilar intermédio de ligação entre os dois níveis de administração pública já existentes (Administração Central e Administração Municipal): As Regiões Administrativas do Continente.

Tem havido muitas iniciativas comemorativas em torno das primeiras eleições para o poder local, no entanto as opções ideológicas e políticas no âmbito do pacto de agressão da “troika”, com a conivência mais acutilante do último governo PSD/CDS, que liquidou milhares de freguesias, muitas delas no distrito da Guarda.

Volvido este período, mais uma vez o PCP apresentou propostas na Assembleia da República para o retorno das freguesias extintas, mas a postura do PS compromete as referidas propostas. A obra realizada ao serviço das populações nos últimos 40 anos pelo Poder Local – Freguesias e Municípios – e o papel relevante dos trabalhadores das autarquias na execução da mesma constitui uma realidade reconhecida pelos cidadãos de todos os quadrantes políticos e em todo o território nacional, quer pelo seu contributo no consolidar das novas instituições democráticas, quer pela notável contribuição que deu para a efetiva melhoria da qualidade de vida das populações, nas transformações sociais, culturais, económicas e ambientais das comunidades, e na valorização, promoção e proteção do território.

Neste sentido, se porventura o Poder Local é o primeiro degrau da democracia, não percebo a atitude de alguns que olham de soslaio para os eleitos próximos das populações. Infelizmente, não compreendo a existência de algum caciquismo nos que determinam as decisões, inclusive com a conivência de muitos eleitos nas freguesias, assim se percebe a orientação de votação na Assembleia Municipal da Guarda. Um projeto coerente e dinâmico implica compromissos e sobretudo exigência perante o poder municipal, tal como este deve ter perante o poder central. Não pode e nem deve a matriz financeira sobrepor-se às ideologias políticas em que cada um acredita, defende e pratica. Para meu desgosto assisto a muitos “cataventos” na política.

Volvidos 40 anos sobre as primeiras eleições para o Poder Local que contam com maior participação das populações, é sinónimo de democracia representativa e também de democracia participativa que importa aprofundar mais, infelizmente o despovoamento e o envelhecimento de muitas freguesias rurais comprometem o desenvolvimento social do mundo rural.

Não será difícil perceber que se fossem inteiramente respeitados e cabalmente cumpridos os princípios e o espírito constitucional, Portugal não seria hoje o país das assimetrias que o caracterizam. Assimetrias de natureza territorial entre o interior e o litoral agravadas por uma macrocefalia crescente e uma burocracia centralista paralisante que torna todo o território interior num imenso espaço ocupado por uma população cada vez mais reduzida e envelhecida e onde é cada mais difícil viver. Assimetrias de natureza económica e social que também se têm vindo a acentuar, sendo cada vez mais gritantes as desigualdades existentes entre os portugueses. Em ano eleitoral para as autarquias seria importante recentrar o papel da Regionalização.

Por: Honorato Robalo

* Membro do executivo da DORG do PCP

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