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Reflexões sobre o Governo

Razão e Região

No próximo dia 12, faz um ano que o Governo presidido por José Sócrates tomou posse. Pode-se, naturalmente, dizer tudo, bem ou mal, mas uma coisa é certa: este Governo tem valores, tem uma estratégia e é determinado na acção. Os valores são os do socialismo democrático: liberdade responsável, igualdade de condições e solidariedade activa. Sócrates teve ocasião, durante a campanha interna para a liderança do PS, em 2004, nas «Novas Fronteiras», de os formular com rigor. A estratégia, essa, parte do reconhecimento de que o desenvolvimento na sociedade da informação se funda no conhecimento, na qualificação, nas tecnologias, na telemática e na inovação de processos, de produtos e de serviços. Por isso, também já em 2004, o actual Primeiro- Ministro propôs uma estratégia a que chamou «Plano Tecnológico». Por sua vez, a sua acção determinada decorre precisamente da força das convicções, da solidez das ideias e, consequentemente, da vontade formada. As medidas já tomadas mostram que este é também um Governo que, além de manifesta capacidade de decisão, possui também uma boa dose de capacidade de acção.

Este o registo que tem marcado a acção deste Governo.

Por um lado, decidindo atacar directamente uma grave fragilidade social no plano das prestações solidárias públicas, ao assumir como prioritária a tarefa de retirar da miséria encoberta um sem número de idosos, o Governo pôs em prática o princípio da solidariedade activa. Por outro lado, ao decidir proceder à convergência dos regimes público e privado de segurança social, de saúde e de trabalho, pôs em prática o princípio democrático da igualdade de condições para todos e iniciou o desmantelamento dos regimes de natureza corporativa que se foram multiplicando e desenvolvendo ao longo dos cerca de trinta anos de democracia. Finalmente, ao agilizar a Justiça e a Administração, ao promover a qualificação dos portugueses, quer na frente educativa quer na frente profissional quer, ainda, na frente cultural, e ao apoiar as iniciativas empresariais inovadoras, o Governo está a promover o exercício de uma cidadania activa e responsável como condição essencial para o desenvolvimento sustentável do país.

Podemos, pois, falar de uma estratégia em ampla rede capaz de promover o desenvolvimento e o crescimento e de garantir o emprego e a coesão social.

É pouco? A verdade é que a acção dos governos é nestes esferas – e, naturalmente, na segurança, nas finanças e na diplomacia – que se exerce fundamentalmente. Isto é, na criação de condições estruturais que favoreçam a livre afirmação dos indivíduos quer no plano económico quer no plano ético-político quer no plano social, em nome do princípio democrático da igualdade de condições. O tempo do Estado absoluto já lá vai, como já lá vai o tempo Estado planificador da economia. Agora é tempo do Estado que garanta bens públicos essenciais, condição imprescindível para que se materialize esse princípio fundamental do sistema democrático que é o princípio da igualdade. É também tempo do Estado que garanta as condições estruturais para o desenvolvimento, que crie um ambiente amigo da economia e do desenvolvimento. Um Estado que, sendo amigo do desenvolvimento e do crescimento económico não deixe também de ser amigo directo dos cidadãos, garantindo-lhes universalmente bens públicos essenciais independentemente da sua condição privada. Um Estado, em suma, que se adapte às novas fracturas sociais, aos novos riscos e às novas exclusões, colocando-se especialmente ao lado dos cidadãos mais radicalmente por elas atingidos, sem abandonar as prestações sociais universais próprias de um Estado Social moderno.

Pois bem. Creio que será justo reconhecer que este Governo tem vindo a agir com determinação neste sentido, apesar de, ao mesmo tempo, ter de responder às difíceis exigências da consolidação de finanças públicas em situação de grave desequilíbrio.

É certo que muitos grupos profissionais têm vindo a ser atingidos em privilégios conseguidos ao longo de três décadas de democracia. Mas também é certo que não poderão deixar de reconhecer que a reposição do princípio da igualdade de condições mais não significa que reposição da democracia lá onde já se estava a resvalar para um regime de tipo quase corporativo.

Os efeitos da opção estratégica para o desenvolvimento não serão visíveis imediatamente. E, todavia, a reposição do clima de confiança e a criação de um ambiente amigo da economia já estão a produzir significativos efeitos no investimento privado, designadamente estrangeiro. De qualquer forma, a verdadeira avaliação só poderá ser feita com rigor ao fim de quatro anos. Por agora, sendo os sinais animadores e evidente a força reformista deste Governo parece-me justo que se continue a depositar confiança em quem não a tem vindo a defraudar. Bem sei que sou suspeito. Mas acreditem que sou sincero.

Por: João de Almeida Santos

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