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Quem não tem cão (ou o cão não está para isso), caça mesmo com gato?

Ainda que o cinema não seja a minha área, não resisto a comentar as cenas dos últimos takes da “Tragédia da política portuguesa”.

Santana revelou nestes quatro meses a sua inabilidade para governar, para gerir uma equipa que trabalhe com objectivos, de preferência comuns, em prol de um país melhor, economicamente estável e socialmente justo. Cumulativamente, falhou naquilo que sabe fazer melhor, levar-nos a acreditar que era capaz.

Há quatro meses foi-lhe entregue em mãos um compromisso com data de validade, implícita no aviso bigbrotheriano do presidente da república. Santana não ligou, achou talvez, com a sua vaidade e grande auto-estima, que era apenas uma forma de o PR justificar ao PS a não dissolução, nessa data, da assembleia da república. Mas, afinal, enganou-se.

Viveram-se quatro meses de descoordenação no governo e de instabilidade dentro do próprio PSD. O governo e o partido conseguiram que todo o país percebesse os conflitos entre os Santanistas e três grandes nomes do PSD…Marques Mendes, Marcelo e, por último, Cavaco. Fragilizou-se a relação do primeiro-ministro com o seu grande aliado de sempre, a comunicação social, veículo dos seus fluidos discursos a um país desesperado. Entretanto, outros aprenderam, talvez até com ele, a usar esse precioso meio. Passou a ser pouco relevante se as medidas económicas e sociais eram boas ou más, tardias ou precoces.

A Santana restava-lhe apresentar-se como vítima, procurando algum calor junto das portuguesas e dos portugueses. Chamou maus aos irmãos que o esbofetearam nas suas breves passagens pela incubadora. Esteve mal…ao revelar a sua fragilidade ao país, esqueceu-se do presidente da república…e ele estava atento. Pediu que o deixassem trabalhar….mas ninguém acredita no trabalho de alguém incapaz de sobreviver sem máquina. E a máquina que Santana Lopes pensara ter montado bem, revelou sérias disfunções ao longo dos últimos meses.

Ainda assim, a notícia da dissolução foi uma surpresa. Não porque não houvesse razão, mas sim porque surgiu na sequência de uma conversa de 2.ª feira, em que, aparentemente, o assunto que estava na mesa era a substituição de um ministro, não de um governo. Na 4.ª feira era o dia em que iria ser indicado o nome do futuro membro do governo mas, curiosamente, Santana é chamado no dia anterior para receber a notícia da dissolução. Perguntamo-nos: o que se teria passado nessa noite? Sampaio fechou-se em copas, alegando que só depois de ouvir o Conselho de Estado e os partidos falaria ao país. “Ouvir” foi a palavra e para mim foi outra surpresa. Estará o senhor presidente à espera de ouvir algo que altere as razões da sua decisão?… É que a decisão está tomada e é pública, chamam-lhe bomba atómica e o botão foi premido. Serão apenas formalismos do “regular funcionamento das instituições”? Aguardamos, tal como aguarda o presidente da Assembleia da República.

Entretanto, José Sócrates, que nestes tempos não necessitou sequer de fazer oposição, continua ocupado em busca de uma estratégia, primeira e fácil para ganhar as legislativas e segunda, bastante mais difícil, para governar o país. Quem diria…há quatro meses não imaginava sequer poder vir a ser candidato a primeiro-ministro. Paralelamente, a maioria dos membros do Conselho Nacional do PSD, agora unido, continua a achar que o menino Pedro é o melhor candidato para as eleições de Fevereiro. E, provavelmente, ao lado do menino Paulo, juntinhos na sua missão apostólica.

E é assim, os grandes líderes já não se fazem pelos seus grandiosos actos, fazem-se pelos inconsequentes actos de outros duvidosos líderes, ou simplesmente pelas circunstâncias do caos.

Resta-nos ficar, e acreditar que é possível caçar com gato, ou fugir…mas para onde? Se tiver oportunidade de conferenciar com Durão Barroso, adiantarei algumas possibilidades num próximo artigo.

Por: Cláudia Quelhas

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