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Quem mais subprima, mais se lhe arrima

observatório de ornitorrincos

A crise chegou. Outra vez. Depois da crise dos bens alimentares, da crise do petróleo, da crise de nervos, agora foi a vez dos mercados financeiros darem o berro. Dar o berro é a expressão devida, porque os executivos da finança fizeram um chavascal tão grande que até o ministro Mário Lino acordou – embora continue a sonhar com o aeroporto e o TGV.

Há pessoas que não entendem como começou esta falência do sistema financeiro, nem o que é o subprime, nem porque rebentou a bolha imobiliária, nem o que são activos tóxicos e muito menos a razão para os bancos emprestarem dinheiro uns aos outros. Mas não falemos agora dos administradores dos bancos e das seguradoras. O que importa é o que vai acontecer ao nosso dinheiro. O governo veio pressurosamente garantir que não lhe vai acontecer nada. Nada de novo, pelo menos. Aparentemente vai apenas continuar a faltar.

A culpa desta crise é obviamente de todos portugueses, que deixaram de poupar e passar fome, ainda por cima ao mesmo tempo. E dos bancos, que emprestavam dinheiro em barda e sem escrutínio. Por exemplo, muita gente pediu crédito bancário para comprar um computador, quando podia muito bem ter esperado para receber um da Microsoft e ainda cumprimentar um ministro. Houve aqui esbanjamento, como se vê.

Um dia, as empresas financeiras descobriram que não tinham dinheiro para pagar as contas nem amigos que lhes confiassem dinheiro e tiveram de recorrer o auxílio do Estado. Foi uma experiência típica da adolescência. Má gestão, bancarrota, pedir aos pais. Injectar dinheiro no sistema é como depositar dinheiro aos filhos antes da mesada seguinte. É por isso que mesmo muitos liberais encartados defendem que quando o papá dá dinheiro para o menino não passar fome deve ter o direito de lhe pedir para não chegar tarde a casa. E não espatifar mais BMW’s. Para pais mais progressistas, que gostam de aconselhar os filhos sobre a vida sexual, também tenho uma metáfora. Já que os impostos que pagamos servem como garantia no caso de não pagarmos o que devemos, talvez os governos pudessem dizer isto, em jeito maternal: “Está aqui este dinheiro, vai lá à tua vida, mas olha, meu filho, pelo menos não forniques as pessoas”.

Não se pense que discordo da intervenção nos mercados com fundos públicos. Bem sei que sem liquidez financeira dos bancos, as empresas não podem continuar a criar postos de trabalho. E o país precisa sempre de mais um call-center.

Razão tinha Ambrose Bierce, quando escreveu no Dicionário do Diabo que a economia era “adquirir o barril de uísque que não é necessário pelo preço da vaca que não se tem dinheiro para comprar”. E com isto não estou a insinuar que os especuladores são bêbedos e os agentes imobiliários, lambões. Estou a citar.

Se Bierce fosse vivo, talvez tivesse ganho com esta frase o prémio Nobel da Economia. Já o da literatura era difícil. Ambrose Bierce era americano.

PS – Não foi só a alta finança que entrou em crise com o rebentamento da bolha. O Sporting também entrou em crise quando rebentou a bolha de Paulo Bento. Isto é para os leitores perceberem que, embora dedique muito espaço a assuntos fúteis, como acontece esta semana, não estou desatento aos verdadeiros problemas da humanidade.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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