Arquivo

Prioridades no investimento autárquico

A propósito de um texto do senhor Vereador Luís Barreiros da Câmara da Covilhã tenho a informar que não tenho prazer nenhum em votar contra empréstimos. Nem esse voto, Contra, representa qualquer tipo de estratégia política. Não votei contra estes dois empréstimos em si mas contra aquilo que representam em termos de instabilidade financeira. Ora um empréstimo de 1.257.601,00 para financiamento do Plano de Actividades e outro de 1.952.286,10 para financiamento de obras do Programa POLIS que totalizam 3.209.887,10 vêm certamente constituir uma receita importante mas, ao mesmo tempo, agravar o endividamento da autarquia que, no final de 2003, se situava em 15,3 milhões de contos (76.716.506euros). Ora apesar do crescente recurso a empréstimos (10,4 milhões de contos/51.936.095euros, em 2003) as dívidas a fornecedores continuaram a evidenciar um valor muito significativo, 9.465.874euros, o que representa um crescimento de 94% face a 2002. Por outro lado, e tendo em conta que a CMC utilizou quase pela totalidade os valores referentes aos empréstimos bancários e que a despesa resultante do serviço da dívida registará uma progressão fortíssima em resultado do término dos períodos de carência dos 14 empréstimos contraídos entre 1998-2003, no valor total de 7,8 milhões de contos, é difícil, em consciência, aprovar mais empréstimos neste cenário. Em 2003 a receita por via de empréstimos bancários representava 24,5% da receita total e 43% das receitas de capital. Ou seja, por cada 100 euros investidos pela CMC, 25,14euros eram referentes a empréstimos bancários.

É impressionante como seis anos depois o PSD ainda culpa a gestão socialista que teve lugar entre 1994 e 1997 por todos os males que acontecem na autarquia. Convém recordar que, nessa altura, o PSD no governo não cumpria a Lei da Finanças Locais e asfixiava a saúde financeira das autarquias. É com o governo do PS que se implementa um processo claro de transferências de capital para as autarquias, através de uma nova fórmula de cálculo onde se impuseram as chamadas transferências automáticas (sem aumento de competências), o que resultou num aumento para os municípios portugueses de 971,2 Milhões de Euros1 no período 1999/2002.

Compara o senhor vereador com o pelouro das finanças os valores de investimento actuais, com os do “fatídico tempo de 1994/1997”, como se na realidade tal comparação nominal fosse possível. Recordo-lhe que em 1993 as transferências do Orçamento Geral do Estado totalizavam 999mil contos, ascendendo em 2004 a 2,3milhões de contos. O executivo liderado pelo Engº Jorge Pombo obteve da Administração Central, ao longo dos seus 4 anos de mandato, 4,6 milhões de contos contra os actuais 13,1 milhões de contos2. Em termos de empréstimos contraídos junto da banca, no período 1994-1997, a oposição PSD sempre se opôs à contratação de financiamento bancário, pelo que o executivo do PS negociou 4 empréstimos num total de 790mil contos, dos quais 400mil contos (Agosto de 1997) foram quase exclusivamente utilizados pelo actual executivo.

Mas, em matéria de mandato autárquico convém recordar também uma oposição PSD que fazia da política do “bota-abaixo” o seu sentido de estado e de preocupação com o desenvolvimento da Covilhã. Não podemos, por isso, comparar a conjuntura da época com a actual Porém, em todo o caso, a dívida da autarquia em 1997 era de 3,4 milhões de contos (17.286.796,00euros) e em 2003 situou-se nos 15,3 milhões de contos (76.716.506euros). Ou seja, o crescimento em valor absoluto foi de 11,9 milhões de contos (59.429.710euros) e representou um aumento de 343,8%. Fazendo um exercício de comparação com as indicações estatísticas do INE ao nível da população residente no concelho verifica-se que em 1997 cada covilhanense devia 63 contos (314,24euros), em 2002 este valor subiu para 240 contos (1197,00) e em 2003 ascende a 282 contos (1.407euros); ou seja, verificou-se um crescimento nominal de 347,6% (219 contos).

Muitos defendem que as dívidas não interessam porque as câmaras não vão à falência. Desde que haja obra o resto não interessa. Sabemos que não é assim. Uma Câmara em falência técnica precisa de contratualizar com o estado o seu saneamento financeiro. Fica durante algum tempo sem autonomia, sem capacidade de gerar investimento. Algumas câmaras do nosso país encontram-se nessa situação. Afinal o perigo existe! Daí que seja necessário andarmos com cautelas na projecção dos investimentos. É evidente que não se podem desperdiçar os fundos comunitários. Antes pelo contrário, devem ser aproveitados ao máximo. É por isso que deve haver planeamento rigoroso e definição de prioridades de investimento.

Por: Miguel Nascimento *

* Vereador do PS na Câmara Municipal da Covilhã

1 Fonte: OGE 1998 a 2002

2 1º Mandato: 6,9Mcts; 2º mandato (incluindo 2004): 6,4Mcts

Sobre o autor

Leave a Reply