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Por favor não me cortem a água

Já aconteceu a muitos chegarem a casa e encontrarem a água cortada. Por desleixo ou esquecimento, ou falta de dinheiro, mesmo depois do último aviso, não se pagou a fatura e o resultado foi o inevitável: os Serviços Municipalizados de Água e Saneamento, em rigoroso cumprimento do regulamento e do contrato firmado com o munícipe, vieram cortar o abastecimento.

Isto não admira, atendendo ao rigor com que as câmaras municipais, enquanto entidades públicas devem cumprir leis e regulamentos. A da Guarda, por exemplo, no que toca a dívidas tem sido particularmente atenta, cobrando e pagando, sempre com grande visibilidade. Há dois anos, por exemplo, reuniu algumas dezenas de credores numa sala e pagou-lhes perante a comunicação social mais de dois milhões de euros de faturas em atraso. Entre estes credores, e já lá vamos, não constava a Águas de Portugal (ou Águas de Lisboa e Vale do Tejo, ou Águas do Zêzere e Côa, que a empresa tem sucessivamente mudado de nome), a empresa que passou a fornecer a água aos municípios para estes a revenderem depois aos munícipes. Já em 2016 viria a Câmara da Guarda a reduzir a sua dívida em mais sete milhões de euros, mais uma vez com algum aparato propagandístico – talvez justificado, já que o avultado passivo e o seu custo em juros e encargos é há muitos anos um dos maiores problemas do município.

Perante isto, caiu com estrondo, já este mês, a notícia do “Correio da Manhã” de que a Câmara da Guarda acumulou mais de 25 milhões de euros em dívida à Águas de Portugal, numa dívida que é a maior de todas as câmaras municipais do país. O que significa, caro leitor e munícipe, que se não pagar a água a Câmara corta-lhe o fornecimento, mas a própria Câmara não paga a água que lhe fornece a si. O que significa outra coisa ainda, com direito a pergunta: e que faz a Câmara ao dinheiro que os munícipes consumidores de água lhe pagam a ela diretamente pelo abastecimento?

É evidente que as rotundas e os eventos custam dinheiro, mas não haveria que definir algo melhor as prioridades? É que o passivo vencido implica contencioso e juros agravados, que nós, os cidadãos da Guarda, que até pagamos atempadamente as faturas, teremos de suportar mais tarde ou mais cedo através das muitas taxas e impostos de que a Câmara se irá servir para o efeito. Ou, com algum humor negro à mistura, através da fatura da água.

Por: António Ferreira

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